Monografia - Leandro Pereira - Univali

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A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale ... Responsabilidade Civil do Transportador nos Contratos de Transporte.
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

A RESPONSABILIDADE CIVIL DO TRANSPORTADOR NOS CONTRATOS DE TRANSPORTE MARÍTIMO INTERNACIONAL DE MERCADORIA

LEANDRO PEREIRA

Itajaí, outubro de 2006

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

A RESPONSABILIDADE CIVIL DO TRANSPORTADOR NOS CONTRATOS DE TRANSPORTE MARÍTIMO INTERNACIONAL DE MERCADORIA

LEANDRO PEREIRA

Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Orientador: Professor Dr. Diego Richard Ronconi

Itajaí, outubro de 2006

“A forma mais terrível de naufrágio é não partir” Amyr Klink.

MEUS SINCEROS AGRADECIMENTOS:

A Deus, por ter me proporcionado saúde e condições de continuar na busca de um sonho.

Aos meus pais João Brás Pereira e Célia Minela, meus irmãos Alessandro Pereira e João Brás Pereira Júnior, pela compreensão, amizade e amor dedicados ao longo de minha vida.

A Elisabeth Joos Blanck, por ter me brindado com sua amizade, compreensão e por ter se tornado minha segunda mãe, assim a considero.

Fabiano Collato, que se tornou meu melhor amigo de todos os tempos, seja nas horas alegres, como nas horas difíceis que passei e que precisei.

Ana, Fernando e Marla, pela amizade construída nos meus quatros anos de estágio no Fórum da Comarca de Balneário Piçarras/SC e que perdura acesa até hoje.

A Drª Ana Vera Sganzerla Truccolo, Juíza de Direito da Comarca de Balneário Piçarras/SC, por todos os ensinamentos e carinho com que me tratou durante estágio.

A Drª Viviane Daminani Valcanaia, Promotora de Justiça da Comarca de Balneário Piçarras/SC, por seu profissionalismo e por ter me brindado com sua amizade.

Ao Dr. Osvaldo Agripino de Castro Júnior, por me ajudado paralelamente na produção desse Trabalho.

Ao Meu Orientador Dr. Diego Richard Ronconi, pela atenção dispensada durante todo o tempo da produção desse trabalho.

ESTE TRABALHO DEDICO ESPECIALMENTE:

Ao Sr. João Brás Pereira e Sra. Célia Minela, por todo amor e carinho que vocês vêm me proporcionando até os dias de hoje.

TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Itajaí (SC), outubro de 2006

Leandro Pereira Graduando

PÁGINA DE APROVAÇÃO A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Leandro Pereira, sob o título Responsabilidade Civil do Transportador nos Contratos de Transporte Marítimo Internacionais de Mercadorias, foi submetida em 21/11/2006 à banca examinadora composta pelos seguintes professores: Dr. Diego Richard Ronconi, Dr. Osvaldo Agripino de Castro Júnior e Jaqueline Daros Abreu de Oliveira, e aprovada com a nota 9,4 (nove virgula quatro).

Itajaí (SC), outubro de 2006

Dr. Diego Richard Ronconi Orientador e Presidente da Banca

Msc. Antônio Augusto Lapa Coordenação da Monografia

ROL DE CATEGORIAS Rol de categorias que o Autor considera estratégicas à compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais. Avarias: “São os danos, as perdas e as despesas extraordinárias que o navio, ou sua carga, sofrem durante a expedição marítima, sendo melhor definida no art. 761 do Código Comercial, que assim dispõe: Todas as despesas extraordinárias feitas a bem do navio ou da carga, conjunta ou separadamente, ou todos os danos acontecidos àquela ou a esta, desde o embarque até a sua volta e desembarque, são reputadas avarias”1 B/L Conhecimento de Carga / Embarque: “É o documento mais importante do comércio marítimo, pois é um título de crédito que representa mercadoria nele descrita, evidenciando a existência de um contrato de transporte”2. CIF: “No CIF (custo, seguro e frete) as mercadorias têm o preço acrescido do seguro marítimo e do frete; usando esse termo, o exportador, por pagar o frete, escolhe a embarcação que transportará as mercadorias”.3 Contrato: “(...) é o acordo de duas ou mais vontades, na conformidade da ordem jurídica, destinado a esclarecer uma regulamentação de interesses entre as partes com o

1

CASTRO JR, Osvaldo Agripino. Introdução ao direito marítimo In: CASTRO JR, Osvaldo Agripino de. (org.) Temas Atuais de Direito do Comércio Internacional, vol. I. Florianópolis: OAB/SC, 2004. p. 107. 2 CASTRO JR, Osvaldo Agripino. Introdução ao direito marítimo In: CASTRO JR, Osvaldo Agripino de. (org.) Temas Atuais de Direito do Comércio Internacional, vol. I. p. 112. 3 ANJOS, J. Haroldo dos, GOMES, Carlos Rubens Caminha. Curso de direito marítimo. Rio de Janeiro: Renovar, 1992. p.178.

escopo de adquirir, modificar ou extinguir relações jurídicas de natureza patrimonial”4. Contrato de Afretamento: “Fretamento ou afretamento é o contrato pelo qual uma pessoa, o fretador, coloca à disposição de outra pessoa, o afretador, seu navio ou partes dele, mediante o pagamento de uma soma denominada de frete. É um contrato misto de locação de coisas e prestação de serviços, variando os dois conforme a modalidade que se apresente”.5 Contrato de Transporte: “É aquele em que uma pessoa ou empresa se obriga, mediante retribuição, a transportar, de um local para outro, pessoas ou coisas animadas ou inanimadas (CC, art. 730). A empresa de transporte, pessoa física ou jurídica, está apta à oferta e à prestação de serviços de deslocamento de pessoas e de mercadorias por via terrestre, aquaviária, revestindo-se, ferroviária e aérea, mediante contratos celebrados com os respectivos usuários, revestindo-se para tanto de forma empresarial, quer em nome individual, quem nome coletivo, e assumindo os riscos decorrentes desse empreendimento”6. Contrato de transporte Marítimo: “É um acordo escrito mediante o qual o armador se compromete a transportar mercadorias por água, numa expedição marítima, recebendo em troca ma quantia em dinheiro denominada frete. Assim o frete é o preço do transporte”.7 FOB:

4

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. 21 ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 24. 5 ANJOS, J. Haroldo dos, GOMES, Carlos Rubens Caminha. Curso de direito marítimo. Rio de Janeiro: Renovar, 1992. p.184. 6 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. v. III, 18 ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 417. 7 GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. 2 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p.145.

“No caso FOB (posto a bordo), significa que as mercadorias serão postas a bordo pelo exportador, e daí por diante as despesas e responsabilidade correrão por conta do importador”.8 Navio e embarcação: “Espécie do gênero embarcação, construção flutuante de natureza móvel, destinada a uma navegação que habitualmente o submete aos riscos do mar, sendo necessário que tenha robustez para enfrentar as fortunas das viagens marítimas, personalidade, nacionalidade e nome. A Convenção Internacional para Unificação de Certas Regras em Matéria de Conhecimentos Marítimos, em seu art. 1°, define navio como sendo “toda embarcação d estinada ao transporte de mercadorias por mar”. A embarcação, por sua vez, de acordo com o item 0108 da NORMAM 03, expedida pela Diretoria dos Portos e Costas, ao regulamentar a Lei 9.537, de 11 de dezembro de 1997, que dispõe sobre a segurança do tráfego aquaviário – LESTA, “é qualquer construção inclusive as plataformas flutuantes e as fixas, quando rebocadas, sujeitas à inscrição na autoridade marítima e suscetível de se locomover na água, por meios próprios ou não, transportando pessoas ou cargas”. No caso de embarcação de esporte ou recreio, o seu registro de propriedade, conforme item 0209, da NORMAM 03, será deferido à pessoa física residente e domiciliada no País, às entidades públicas ou privadas sujeitas às leis brasileiras, e aos estrangeiros, mesmo aqueles não residentes nem domiciliados no País, de acordo com a Lei n° 7.652/88 alterada pela Lei n° 9 .774/98”9. Responsabilidade Civil: “Responsabilidade Civil é a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ela

8

ANJOS, J. Haroldo dos, GOMES, Carlos Rubens Caminha. Curso de direito marítimo. Rio de Janeiro: Renovar, 1992. p.178. 9 CASTRO JR, Osvaldo Agripino. Introdução ao direito marítimo In: CASTRO JR, Osvaldo Agripino de. (org.) Temas Atuais de Direito do Comércio Internacional, vol. I. p. 105.

mesma praticado, por pessoa por quem ela responde, por coisa a ela pertencente ou de simples imposição legal”10. Transporte aquaviário:

“(art. 1º, §1º, II) – Dispõe sobre a sua ordenação a Lei nº. 9.432, de 08.01.97, abrangendo o afretamento, o armador, a tripulação, a marinha mercante e os regimes de navegação. A lei nº 9.443, de 08.01.97, instituiu a política nacional de recursos hídricos, inclusive

no

que

toca

ao

transporte

aquaviário,

criando

sistema

de

gerenciamento”.11 Transporte Marítimo: “Transporte é o conjunto de meios que possibilitam o deslocamento de bens e pessoa. Para que haja produção é necessário que se localizem no mesmo lugar a mão-de-obra, a matéria-prima e o equipamento de transformação, carecendo, ainda carecendo ainda do meio para colocar tal produto no mercado. Como cada país possui suas vantagens comparativas, ou seja, produtos e serviços que são característica da própria geografia e cultura do povo, o transporte surge como elemento essencial para a divisão do trabalho e ampliação de mercado. Nesse quadro, pode-se sustentar que a relação entre mobilidade e renda é tal que países nos quais bens e povo movem-se com facilidade têm, relativamente, alta renda per capita, pois países que dependem de transporte não podem gerar maior produtividade. Por sua vez, grande parte do transporte e do comércio internacional é feito entre nações separadas por oceanos, por rios e lagos, sendo esse gênero de transporte denominado aquaviário, e por ocorrer nos mares e oceanos, chama-se transporte marítimo, sendo imbatível no tocante ao preço e à capacidade de movimentar grandes quantidades de mercadorias”.12

10

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro – Responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva: 1999, v.7, 13 ed., p.36. 11 SILVA, De Plácido.Vocabulário jurídico. 11 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p.830. 12 CASTRO JR, Osvaldo Agripino. Introdução ao direito marítimo In: CASTRO JR, Osvaldo Agripino de. (org.) Temas Atuais de Direito do Comércio Internacional, vol. I. p. 104.

SUMÁRIO

RESUMO .........................................................................................XIV INTRODUÇÃO ................................................................................. 15 CAPÍTULO 1 .................................................................................... 18 BREVES NOÇÕES SOBRE RESPONSABILIDADE CIVIL.............. 18 1.1 BREVE HISTÓRICO ACERCA DA RESPONSABILIDADE RIVIL. ...............18 1.2 CONCEITO E ELEMENTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL ....................21 1.3 ESPÉCIES E FORMAS DE RESPONSABILIDADE CIVIL ............................24 1.3.1 RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL ..........................................................25 1.3.2 RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL ................................................26 1.3.3 RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA ..............................................................28 1.3.4 RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA ...............................................................30 1.4 EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE CIVIL .......................................34

CAPÍTULO 2 .................................................................................... 43 CONSIDERAÇÕES SOBRE OS CONTRATOS DE TRANSPORTE E SUAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS............................................ 43 2.1 CONCEITO DE CONTRATO DE TRANSPORTE ..........................................43 2.2 ESPÉCIES DE CONTRATOS DE TRANSPORTE .........................................44 2.2.1 CONTRATO DE TRANSPORTE DE PESSOAS ........................................................45 2.2.2 CONTRATO DE TRANSPORTE DE COISAS ..........................................................51 2.3 FORMAS DE TRANSPORTE .........................................................................56 2.3.1 CONTRATO DE TRANSPORTE TERRESTRE .........................................................57 2.3.2 CONTRATO DE TRANSPORTE AÉREO ................................................................59 2.3.3 CONTRATO DE TRANSPORTE MARÍTIMO, LACUSTRE E FLUVIAL...........................60 2.3.3.1 Marítimo ...................................................................................................60 2.3.3.2 Fluvial......................................................................................................61 2.3.3.3 Lacustre ...................................................................................................61

2.4 REQUISITOS E ELEMENTOS DOS CONTRATOS DE TRANSPORTE .......61 2.5 AS CONVENÇÕES E TRATADOS INTERNACIONAIS ACERCA DOS CONTRATOS DE TRANSPORTE........................................................................62

CAPÍTULO 3 .................................................................................... 65 OS CONTRATOS DE TRANSPORTE MARÍTIMO INTERNACIONAL DE COISAS E A RESPONSABILIDADE CIVIL DO TRANSPORTADOR ......................................................................... 65 3.1 TRANSPORTE MARÍTIMO INTERNACIONAL DE COISAS E OBRIGAÇÕES DO TRANSPORTADOR .......................................................................................65 3.2 AVARIAS NO TRANSPORTE MARÍTIMO .....................................................69 3.2.1 AVARIA GROSSA ............................................................................................71 3.2.2 AVARIA PARTICULAR ......................................................................................73 3.3. EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE CIVIL DO TRANSPORTADOR MARÍTIMO DE COISAS POR AVARIAS .............................................................74 3.4 OS TERMOS INICIAL E FINAL DA RESPONSABILIDADE DO TRANSPORTADOR .............................................................................................80 3.5. CLÁUSULAS EXONERADORAS AJUSTADAS ENTRE O TRANSPORTADOR E O CARREGADOR ...........................................................81 3.5.1. CONCEITO CLÁUSULAS EXONERADORAS .........................................................81 3.5.2. VANTAGENS DA CLÁUSULAS EXONERADORAS .................................................82 3.5.3. DESVANTAGENS DAS CLÁUSULAS EXONERADORAS ..........................................82 3.6. LEGISLAÇÃO ESPECIAL APLICÁVEL AO CONTRATO DE TRANSPORTE MARÍTIMO ............................................................................................................83 3.6.1 CÓDIGO CIVIL .................................................................................................85 3.6.2 CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR ..............................................................86 3.6.3 TRATADO DE TRANSPORTE MULTIMODAL DO MERCOSUL....................................90 3.6.3.1 Do Documento ou Conhecimento de Transporte Multimodal.............91 3.6.3.2 Responsabilidade do Operador de Transporte Multimodal ................92 3.6.3.3 Responsabilidade do Expedidor............................................................94

CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................. 95 REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS ........................................ 100

RESUMO

O estudo sobre o tema A Responsabilidade Civil do Transportador no Contrato de Transporte Marítimo Internacional de Mercadorias tem por finalidade aprofundar o conhecimento sobre a Responsabilização do Transportador Marítimo ante as avarias ocorridas durante o transporte, visando a realização de uma monografia, para a conclusão do curso e obtenção do grau de bacharel em Direito, pela Universidade do Vale do Itajaí. No primeiro capítulo será tratado sobre noções gerais a respeito da Responsabilidade Civil, sua evolução histórica, elementos e requisitos para a sua caracterização, bem como suas formas e espécies. Já o segundo capítulo abordará os Contratos de Transporte, elementos, formas, espécies e suas relações internacionais. O terceiro capítulo terá como assunto os Contratos de Transporte Marítimo Internacionais e a Responsabilidade Civil do Transportador com suas peculiaridades, tais como a inserção das cláusulas de não indenizar no Conhecimento de Embarque ou Bill of Lading, bem como a legislação aplicável e a Responsabilidade do Transportador contida no Tratado de Transporte Multimodal do Mercosul. Utilizou-se o método indutivo para a elaboração do presente trabalho. O tema é atual e relevante, visto que a região do Vale do Itajaí é Portuária e encontra-se atualmente em expansão, devido ao desenvolvimento econômico do nosso País, em que o mercado de trabalho vem necessitando de pessoal especializado para atuação nas soluções dos conflitos que estão surgindo junto com o crescimento das exportações e importações, cujo o principal meio de transporte utilizado é o marítimo, eis que financeiramente mais viável, tanto aos exportadores quanto aos importadores.

INTRODUÇÃO

A presente Monografia tem como objeto a Responsabilidade Civil do Transportador nos Contratos de Transporte Marítimo Internacional de Mercadorias. O seu objetivo é produzir Monografia para obtenção do Título de Bacharel em Direito – Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI. Para tanto, principia–se, no Capítulo 1, tratando de Responsabilidade Civil, com seus conceitos, elementos, espécies e formas, sendo a responsabilidade contratual, extracontratual, subjetiva, objetiva, por fim as excludentes de responsabilidade civil. No Capítulo 2, tratando de considerações sobre os contratos de transporte e suas relações internacionais, identificando os conceitos e espécies de Contrato de Transporte, sendo o Contrato de Transporte Pessoas, Coisas e sob as formas Terrestre, Aéreo, Marítimo, Fluvial e Lacustre e ainda os requisitos e elementos dos contratos de transporte, por fim as Convenções e tratados internacionais sobre os contratos de transporte marítimo. No Capítulo 3, tratando dos Contratos de Transporte Marítimo Internacionais de Coisas e a Responsabilidade Civil do Transportador, iniciando com o Transporte Marítimo Internacional de Coisas e obrigações do transportador, identificando as Avarias no Transporte marítimo, destacando-se a avaria grossa e a avaria particular, seguido das excludentes de responsabilidade civil, a fixação do termo inicial e final da responsabilidade do transportador, as cláusulas exoneradoras ajustadas entre o transportador e o carregador, com as vantagens e desvantagens da inclusão dessas cláusulas. Após, as abordagens serão a respeito da legislação especial aplicável aos contratos de transporte marítimo, abordando-se o Código Civil e o Código de Defesa do Consumidor.

16

Por fim, o trabalho trata a respeito do conhecimento de transporte multimodal e da responsabilidade transportador e expedidor. A presente Monografia se encerra com as Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos destacados, seguidos da estimulação

à

continuidade

dos

estudos

e

das

reflexões

sobre

a

Responsabilidade Civil do Transportador nos Contratos de Transporte Marítimo Internacional de Mercadorias. Para a presente monografia foram levantadas as seguintes perguntas: Em que condições poderá o transportador marítimo se eximir da responsabilidade de reparação por danos decorrentes de avarias de mercadorias transportadas? É válida a cláusula de exclusão de responsabilidade nos contratos de transporte marítimo por danos causados aos bens objetos do transporte? No entanto, diante de tais indagações foram apresentadas as seguintes hipóteses: 

“O transportador poderá exonerar-se da responsabilidade de reparar o dano na mercadoria avariada se não houver culpa do transportador, ou seja, se o mesmo estiver sob a incidência de falta do afretador, vício próprio da mercadoria, embalagem inadequada.



A Convenção de Bruxelas de 1924, prevê a possibilidade da inserção de cláusulas de isenção de responsabilidade no contrato de transporte marítimo internacional. No entanto, a referida Convenção não foi recepcionada pela legislação brasileira. Portanto não possuem validade no ordenamento jurídico pátrio. Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase

de Investigação foi utilizado o Método Indutivo, na Fase de Tratamento de Dados

17

o Método Cartesiano, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente Monografia é composto na base lógica Indutiva. Nas diversas fases da Pesquisa foram acionadas as Técnicas, do Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da Pesquisa Bibliográfica.

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CAPÍTULO 1

BREVES NOÇÕES SOBRE RESPONSABILIDADE CIVIL.

1.1 BREVE HISTÓRICO ACERCA DA RESPONSABILIDADE CIVIL A Responsabilidade Civil, de acordo com a teoria clássica, está fundamentada em três fatores: o dano, a culpa e o nexo causal entre o dano e a culpa.13 Entretanto, na época em que vigia a Lei de Talião, “olho por olho e dente por dente”, não se cogitava a possibilidade de um terceiro intervir na relação entre as pessoas, visto que imperava a vingança privada imediata.14 Assim discorre Carlos Roberto Gonçalves15: “Nos primórdios da humanidade, entretanto, não se cogitava do fator culpa, o dano provocava a reação imediata, instintiva e brutal do ofendido. Não havida regras, nem limitações. Não imperava, ainda, o direito. Dominava, então, a vingança privada, forma primitiva, selvagem talvez, mas humana, da reação espontânea e natural contra o sofrido; solução comum a todos os povos nas suas origens, para a reparação do mal pelo mal”

Com o decorrer do tempo, a lei de Talião começou a perder força, tendo em vista que a vítima percebeu ser mais vantajoso a troca do cumprimento da pena de forma brutal por pagamento de prestação pecuniária, iniciando o período da composição. Nesse sentido, leciona Pablo Stolze Gagliano16:

13

GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 8 ed. São Paulo: Saraiva. 2003. p. 04. GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p. 04. 15 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p. 04. 16 GAGLIANO, Pablo Stolze, PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. V.III. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 11. 14

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“Há, porém, ainda na própria lei mencionada, perspectivas da evolução do instituo, ao conceber a possibilidade de composição entre a vítima e o ofensor, evitando-se a aplicação da pena de Talião. Assim, em vez de impor que o autor de um dano a um membro do corpo sofra a mesma quebra, por força de uma solução transacional, a vítima receberia, a seu critério e a título de poena, uma importância em dinheiro ou outros bens”

Conforme se colhe da história, segundo Carlos Roberto Gonçalves17, tempos depois, já com a existência de uma autoridade soberana, esta tolhe o direito da vítima de fazer justiça com as próprias mãos, torna obrigatória a composição econômica e impõe tarifações, em que encontra fundamento na Lei das XII Tábuas, Código de Ur-Nammu e Código de Manu, porém ainda não se cogitava a culpa. Somente com os romanos houve a distinção entre pena e reparação, com a distinção dos delitos públicos e privados, sendo que os delitos públicos eram pagos para o Estado e os delitos privados às vítimas. Os fundamentos norteadores da reparação do dano surgem da Lei Aquília, visto que continha elementos caracterizadores da culpa com relação à injúria. Mais adiante, no direito francês foi estabelecido um princípio geral da responsabilidade civil, tornando desnecessária a enumeração de casos de composição obrigatória, bem como vários outros princípios que influenciaram em outros povos. A constatação da responsabilidade civil fundamentada na culpa do agente, in abstracto e a distinção da culpa delitual e culpa contratual, aparece na redação dos arts. 1382 e 1383 do Código de Napoleão. Carlos Alberto Gonçalves18 assim discorre: “A responsabilidade civil se funda na culpa – foi a definição que partiu daí para inserir-se na legislação de todo o mundo”

17 18

GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p. 04-09. GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p. 06.

20

Assim destaca Pablo Stolze Gagliano19: “(...), observe-se que a inserção da culpa como elemento básico da responsabilidade civil aquiliana – contra o objetivismo excessivo do direito primitivo, abstraindo a concepção de pena para substituí-la, paulatinamente, pela idéia de reparação do dano sofrido – foi incorporada no grande monumento legislativo da idade moderna, a saber, o Código Civil de Napoleão, que influenciou diversas legislações do mundo, inclusive o Código Civil Brasileiro de 1916”

Devido ao desenvolvimento industrial, surgiram outras teorias, sendo uma das mais importantes a chamada teoria do risco, eis que supriu as hipóteses que a teoria da culpa não incidia. Carlos Alberto Gonçalves diz: “A responsabilidade seria encarada sob o aspecto objetivo: o operário, vítima de acidente do trabalho, tem sempre direito a indenização, haja ou não culpa do patrão ou do acidentado”20 Porém, a teoria do risco criado não substituiu a teoria da culpa, vez que as duas teorias são aplicas e foram adotadas, recentemente, pelo novo Código Civil Brasileiro. Sobre o assunto, descreve Alvino Lima, apud Pablo Stolze Gagliano21: O momento inovador se levanta contra a obra secular; a luta se desencadeia tenazmente e sem tréguas. Ripert proclama Saleilles e Josserand os ‘síndicos da massa falida da culpa’, e, a despeito das afirmações de que a teoria do risco desfaleceu no ardor de seu ataque, seus defensores persistem na tarefa, e as necessidades econômicas e sociais da vida moderna intensa obrigam legislador a abrir brechas na concepção da teoria clássica da responsabilidade. Ambas, porém continuarão a substituir, como forças paralelas, convergindo para um mesmo fim, sem que jamais, talvez, se 19

GAGLIANO, Pablo Stolze, PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. p. 12. 20 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p. 06. 21 GAGLIANO, Pablo Stolze, PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. p. 13.

21

possam exterminar ou se confundir, fundamentando, neste ou naquele caso, a imperiosa necessidade de ressarcir o dano, na proteção dos direitos lesados.

No art. 186 do Código Civil, encontra-se presente a Responsabilidade Civil fundamentada na culpa, definindo o ato ilícito. (“art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”). Entretanto, art. 927, parágrafo único do mesmo diploma legal prevê as possibilidade de aplicação da Responsabilidade Civil Objetiva, pregada pela teoria do risco, conforme se transcreve: Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza risco para os direitos de outrem

Diante disso, percebe-se claramente, que o atual Código Civil adota os dois tipos de responsabilidade civil. 1.2 CONCEITO E ELEMENTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL O entendimento de Responsabilidade como nos ensina o 22

Mestre Rui Stoco , pode ser extraído “da própria origem da palavra que vem do latim respondere, responder a alguma coisa, ou seja, a necessidade que existe de responsabilizar alguém por seus atos danosos.” Savatier

apud

Silvio

Rodrigues23

conceitua

que

Responsabilidade Civil é “a obrigação que pode incumbir uma pessoa a reparar o prejuízo causado a outra, por fato próprio, ou por fato de pessoas ou coisas que dela dependam”.

22

STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p.89 23 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil – Responsabilidade civil. v.4., 18 ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2002. p.6.

22

Para Cavalieri Filho24 trata-se de “um dever jurídico sucessivo que surge para recompor o dano decorrente da violação de um dever jurídico originário”. Maria Helena Diniz25 entende que: “[...] Responsabilidade Civil é a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ela mesma praticado, por pessoa por quem ela responde, por coisa a ela pertencente ou de simples imposição legal”.

Caio

Mário

Pereira

da

Silva26,

entende

que

“Responsabilidade Civil consiste na efetivação da reparabilidade abstrata do dano em relação a um sujeito passivo da relação jurídica que se forma”. Com fulcro nos conceitos apresentados, entende-se que responsabilidade civil é uma obrigação jurídica de reparação ou indenização de dano ou lesão de direito, seja no âmbito patrimonial ou extrapatrimonial, causado em virtude da culpa ou do dolo por parte do agente, seja por fato próprio, ou por coisas ou terceiros em sua dependência ou ainda por imposição legal, de forma ilícita, a outrem. Entretanto, da leitura do art. 186 do Código Civil, se extrai os elementos caracterizadores da Responsabilidade Civil Aquiliana, ou seja, fundamentada na culpa, que segundo Carlos Roberto Gonçalves27 que afirma que a partir da leitura do artigo supracitado, logo tem-se a idéia de que quatro são os elementos essenciais da Responsabilidade Civil. Assim ele os enumera: 1. Ação ou omissão; 2. Culpa ou Dolo do agente; 3. relação de causalidade e 4. o dano experimentado pela vítima.

24

CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 2.ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 22. 25 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro – Responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva: 1999, v.7, 13 ed., p.36. 26 27

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p.11. GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p.31.

23

Comprovada a existência desses requisitos, surge um vínculo jurídico por força do qual o prejudicado assume a posição de credor e o ofensor, a de devedor. Ação ou omissão do agente. Segundo Silvio Rodrigues28, A conduta causadora do dano pode ser uma ação (ato positivo) ou uma omissão (ausência de ato) que advém de uma conduta própria do agente, ou seja, se o agente fere a vítima, deve indenizá-la. Ressalva ainda: O ato do agente causador do dano impõe-lhe o dever de reparar não só quando há, de sua parte, infringência a um dever legal, portanto ato praticado contra direito, como também quando seu ato, embora sem infringir a lei, foge da finalidade social a que ela se destina

Também, há a responsabilidade por ato de ação ou omissão de terceiros que estão sob sua sujeição, na qual os pais, tutores, curadores, patrões, respondem por atos dos filhos, tutelados, curatelados e empregados. Esta espécie de responsabilidade só ocorre nas hipóteses previstas em lei. E, por fim, pode ocorrer a responsabilidade por danos causados por animais ou coisas sob a guarda do agente. Assim, se partes de uma construção caem na rua causando dano a outrem o dono da obra deve indenizar a vítima. Culpa ou dolo do agente. Da análise do art. 186 do Código Civil, pode-se facilmente constatar a presença desses requisitos, sendo o dolo na ação ou omissão voluntária e a culpa quando se refere a “negligência ou imprudência”. Carlos Roberto Gonçalves29 ensina que “para obter a reparação do dano, a vítima geralmente tem de provar dolo ou culpa strictu sensu do agente”. Pois, como o mesmo menciona, nosso diploma civil adotou a teoria subjetiva.

28

RODRIGUES, Silvio. Direito civil: responsabilidade civil. p. 14 e 15.

29

GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p.32.

24

A responsabilidade civil subjetiva exige a presença da culpa ou do dolo para caracterizar o dever de indenizar. Dolo é a vontade consciente, ou seja, o agente age com a intenção de prejudicar; já a culpa é a negligência, imprudência ou imperícia, ou seja, não há um propósito de causar o dano, este é conseqüência da negligência do agente. Relação de causalidade. Entende Silvio Rodrigues30 que a relação de causa e efeito existente entre a conduta do agente e o dano sofrido pela vítima. Assim, o dano só gera responsabilidade quando é possível estabelecer um nexo causal entre ele e o seu autor, gerando o dever de indenizar, entretanto,

deve-se

observar

as

possíveis

causas

de

excludentes

de

responsabilidade civil, pois se o autor não teve culpa, a este não cabe o dever de indenizar. Dano experimentado pela vítima. É composto por dois elementos: um material e outro formal. Segundo Fischer, apud MONTENEGRO31: Em linguagem vulgar, entende-se o por dano todo prejuízo que alguém sofra na sua alma, corpo ou bem, quaisquer que sejam o autor e a causa da lesão. Em linguagem jurídica, dano é todo prejuízo que o sujeito de direito sofre através da violação dos seus bens jurídicos.

Para que o dano dê ensejo à responsabilidade civil, é imprescindível a presença dos dois elementos: o prejuízo e a lesão a um interesse juridicamente tutelado. 1.3 ESPÉCIES E FORMAS DE RESPONSABILIDADE CIVIL A Responsabilidade Civil poderá se apresentar de algumas espécies, entre elas a contratual e extracontratual e duas formas, subjetiva e objetiva, como se passa a expor.

30

RODRIGUES, Silvio. Direito civil: responsabilidade civil. p.17. MONTENEGRO, Antonio Lindbergh C. Ressarcimento de Danos. 6 ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 1999. p. 07.

31

25

1.3.1 Responsabilidade Civil Contratual Deve existir uma distinção entre Responsabilidade Civil Contratual e Extracontratual; segundo Rogério Marrone de Castro Sampaio32 a Contratual é a que decorre do descumprimento ou inadimplemento contratual, causando prejuízo aos outros contratantes, estabelecendo o artigo 399 do Código Civil: “Não cumprindo a obrigação ou deixando de cumpri-la pelo modo e tempo devido, responde o devedor por perdas e danos”. Compreende-se na Responsabilidade Civil Contratual, antes de existir a obrigação de indenizar, o que existe é um vinculo jurídico entre o inadimplente e o seu contratante, vínculo este derivado da convenção. Nesse sentido exemplifica Carlos Roberto Gonçalves33: uma pessoa pode causar prejuízo a outrem por descumprir uma obrigação contratual. Por exemplo: quem toma um ônibus tacitamente celebra um contrato, chamado contrato de adesão, com empresa de transporte. Esta, implicitamente, assume a obrigação de conduzir o passageiro ao seu destino, são e salvo, se, no trajeto, ocorre um acidente e o passageiro fica ferido, dá-se o inadimplemento contratual, que acarreta a responsabilidade de indenizar as perdas e danos, nos termos do art. 389 do Código Civil. Acontece o mesmo quando o comodatário não devolve a coisa emprestada porque, por sua culpa, ela pereceu. Com o ator, que não comparece para dar o espetáculo contratado. Enfim, com todas as espécies de contratos não adimplidos.

Na Responsabilidade Civil Contratual ou Extracontratual, vários pressupostos são comuns. Desta forma, explica Carlos Roberto Gonçalves34 a distinção entre a Responsabilidade Civil Contratual da Extracontratual, sendo que o Código Civil distinguiu as duas de maneira genérica, fixando os arts. 186 a 188 e 927 e

32

SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil: responsabilidade civil. 3 ed. São Paulo: Atlas, 2003. p. 24. 33 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p.25 34 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p.26

26

seguintes para a Extracontratual e nos arts. 395 e seguintes e 389 e seguintes a contratual. Assevera ainda que: É certo, porém, que nos dispositivos em que trata genericamente dos atos ilícitos, da obrigação de indenizar e da indenização (art. 186 a 188, 927 e s. e 944 e s.) o Código não regulou a responsabilidade proveniente do inadimplemento da obrigação, da prestação com defeito ou da mora no cumprimento das obrigações provenientes dos contratos (que se encontra no capítulo referente aos efeitos das obrigações).

Entretanto, conclui o mesmo autor que, embora essa dualidade de tratamento dos aspectos jurídicos da responsabilidade civil, não se deve traçar muitos duelos, eis que seus efeitos serão uniformes. Na Responsabilidade Civil Contratual a indenização, em muitos casos, quando possível é avaliada pela prestação não cumprida, abrangendo o prejuízo efetivo e também o proveito que o contratante poderia ter tido. No que se refere ao ônus da prova, entende Pablo Stolze Gagliano35, que na Responsabilidade Civil Contratual não será necessário o contratante que cumpriu com sua parte na avença provar a culpa do inadimplente, tendo em vista que, de regra, a culpa é presumida, bastando à vítima, somente, demonstrar o fato do inadimplemento. O contratante é que deverá provar não ter agido com culpa em sentido lato. Ou seja, o contratante inadimplente é que fica com o ônus de provar as excludentes da responsabilidade civil. 1.3.2 Responsabilidade Civil Extracontratual A Responsabilidade Extracontratual é também chamada de aquiliana. Segundo Silvio Rodrigues36, deriva da existência de um fato lesivo à esfera jurídica de outrem, o ato pode ser cometido por pessoa capaz ou incapaz, 35

GAGLIANO, Pablo Stolze, PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. p. 20. 36 RODRIGUES, Silvio. Responsabilidade civil. p.08 e 09.

27

não pressupondo qualquer avença anterior entre ofensor e ofendido. Aplica-se, no caso, os arts. 186 e 927 do Código Civil: "Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, e causar prejuízo a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito." "Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo."

Por conseguinte, responsabilidade aquiliana é resultado da prática de um ato ilícito por pessoa capaz ou incapaz, visto que não há vínculo anterior entre as partes, por não estarem ligadas por uma relação obrigacional ou contratual. A fonte dessa responsabilidade é a inobservância da lei, ou melhor, é a lesão a um direito. Para

Rogério

Marrone

de

Castro

Sampaio37

a

Responsabilidade Civil Extracontratual é assim definida: “No tocante à responsabilidade extracontratual ou aquiliana, o dever de indenizar os danos causados decorre da prática de um ato ilícito propriamente dito (ilícito extracontratual), que se consubstancia em uma conduta humana positiva ou negativa violadora de um dever de cuidado (culpa em sentido lato). Encontra previsão legal no art. 186 do Código Civil (art. 159 do CC/1916). Em outras palavras, a obrigação de reparar o dano não está relacionada à existência anterior de um contrato e ao descumprimento culposo de uma obrigação por ele gerada. Origina-se, outrossim, de um comportamento (genericamente tratado pelo ordenamento jurídico no referido art. 186 do CC) socialmente reprovável. Cita-se como exemplo a hipótese do indivíduo que, dirigindo imprudentemente seu veículo, atropela um pedestre, causando-lhe lesões corporais.”

No tocante ao ônus da prova na Responsabilidade Civil Aquiliana, Rogério Marrone de Castro Sampaio38 entende que esta cabe á vítima, visto que é ela quem deve provar a culpa do agente. Caso não consiga, tal prova ficará sem ressarcimento. 37 38

SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil: responsabilidade civil. p. 24 SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil: responsabilidade civil. p. 25

28

Carlos Roberto Gonçalves39 pactua sobre o mesmo entendimento no que diz respeito do ônus da prova na responsabilidade civil extracontratual: “(...) o autor da ação é que fica com o ônus de provar o fato se deu por culpa do agente (...)”. Importante ressaltar é a questão da capacidade do agente que pratica um ato ilícito, conforme Carlos Roberto Gonçalves40, o incapaz pode ser responsabilizado civilmente nessa modalidade de responsabilidade civil, haja vista a previsão legal do art. 928 do Código Civil, que responsabiliza os incapazes em geral pelos prejuízos que causarem, todas as vezes que as pessoas por eles responsáveis não tenham a obrigação de fazê-lo, ou não disponham de meios suficientes. Silvio Rodrigues41 segue o mesmo entendimento: “Em matéria de capacidade também diversas são as posições. Assim, o menor púbere só se vincula contratualmente assistido por seu representante legal e, excepcionalmente sem ele, se maliciosamente declarou-se maior (CC, art. 180); portanto, só pode ser responsabilizado por seu inadimplemento nesses casos; na responsabilidade aquiliana, entretanto, cumpre-lhe reparar o prejuízo sempre, pois se equipara ao maior quanto às obrigações resultantes de atos ilícitos em que for culpado (CC de 1916, art. 156)”.

Como podemos compreender do entendimento supra citado, quando um menor figura como autor de ato ilícito causador de um dano, este é equiparado ao maior e tem o dever de reparar os prejuízos. 1.3.3 Responsabilidade Civil Subjetiva A responsabilidade civil subjetiva, conforme leciona Silvio Rodrigues42, não se trata de espécie, mas sim, de maneira de encarar o dano, aduz ainda, que a responsabilidade é subjetiva quando inspirada na idéia de culpa, sendo a prova do agente causador do dano indispensável. 39

GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p.28 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p.28 41 RODRIGUES, Silvio. Responsabilidade civil. p.10. 42 RODRIGUES, Silvio. Responsabilidade civil. p.11. 40

29

Carlos Roberto Gonçalves43 assevera que, desde a teoria clássica, se tinha a culpa como fundamento da responsabilidade, também chamada de teoria subjetiva. A prova da culpa do agente passa a ser pressuposto necessário do dano indenizável, sendo assim a responsabilidade do causador do dano se configura, somente se o agente agiu com dolo ou culpa. Afirmou, ainda, que o Código Civil adotou a teoria subjetiva, conforme se verifica no art. 186, elegendo o dolo e a culpa como fundamentos para a obrigação de reparar o dano. A Responsabilidade Subjetiva é atualmente erigida como regra necessária, porém sem prejuízo da adoção da Responsabilidade Objetiva, tendo em vista a previsão desta última em vários artigos no Código Civil. No mesmo sentido, Caio Mário da Silva Pereira44 declara: “A essência da responsabilidade subjetiva vai assentar, fundamentalmente, na pesquisa ou indagação de como o comportamento contribui para o prejuízo sofrido pela vítima. Assim procedendo, não considera apto a gerar o efeito ressarcitório um fato humano qualquer. Somente será gerador daquele efeito uma determinada conduta, que a ordem jurídica reveste de certos requisitos ou de certas características. Assim considerando, a teoria da responsabilidade subjetiva erige em pressuposto da obrigação de indenizar, ou de reparar o dano, o comportamento culposo do agente, ou simplesmente a sua culpa, abrangendo no seu contexto a culpa propriamente dita e o dolo do agente.”

Diante de tais entendimentos, verificou-se que é majoritária a opinião entre os doutrinadores, sobre a Responsabilidade Civil Subjetiva no tocante o seu fundamento na culpa em sentido amplo, sendo necessária a caracterização do dolo ou culpa do agente causador para que o dano possa ser indenizável e, por fim, que nos tempos atuais o Código Civil adotou a Responsabilidade Civil Subjetiva como regra, entretanto há dispositivos que fixam

43 44

GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p. 21-24. PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. p. 29-30.

30

a responsabilização do agente sem a verificação de sua culpa, ou seja a Responsabilidade Civil Objetiva. 1.3.4 Responsabilidade Civil Objetiva A Responsabilidade Civil Objetiva, de acordo com Carlos Roberto Gonçalves45, é possível a responsabilizar um agente causador de um dano, independentemente de sua culpa, desde que previsto por lei. Quando isso ocorre, acontece a responsabilidade legal ou objetiva, visto que prescinde da culpa e se satisfaz apenas com o dano e o nexo de causalidade. Esta responsabilidade, segundo o mesmo autor46, em alguns casos é presumida pela lei, sendo que em outros, é de todo prescindível, tendo em vista que a responsabilidade se funda no risco. Sendo presumida, inverte-se o ônus da prova, restando ao autor da ação provar somente a ação ou omissão, eis que a culpa, nesse caso, é presumida. Entretanto, é facultado ao réu a oportunidade de apresentar provas que excluem a sua culpa, invertendo-se o ônus da prova. Fixa ainda que, com relação aos casos em que se prescinde totalmente da prova da culpa, basta somente que haja relação de causalidade entre a ação e o dano, independentemente de culpa. Aduz

que

a

teoria

do

risco

é

justificada

pela

responsabilidade objetiva. Sendo que a teoria do risco é aplicada a toda pessoa que exerce alguma atividade que cria um risco de dano para terceiros, devendo ser obrigada a repará-lo, ainda que sua conduta seja isenta de culpa, ocorrendo assim o deslocamento da noção de culpa para a idéia de risco, figurado como teoria do risco proveito, tornando-se mais tarde como risco criado. Acrescenta47 que, nos primeiros tempos, a responsabilidade era objetiva, entretanto sem que por isso se fundasse no risco, assim como o conhecemos atualmente, visto que anteriormente a Responsabilidade Objetiva 45

GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p. 21-24. GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p. 21-24. 47 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p. 21-24. 46

31

era baseada na idéia de vingança. Contudo, ultrapassada a essa idéia, surgiu à pesquisa da culpa do agente causador do dano. Atualmente, ocorre a volta ao objetivismo, mas não pela idéia de vingança, mas por entender que culpa não é mais suficiente para regular todos os casos de responsabilidade. Afirmou48, ainda, o autor, a respeito da Responsabilidade Objetiva no contexto histórico, que, a partir da segunda metade do século XIX, foi que a questão da Responsabilidade Civil Objetiva ganhou estrutura, aparecendo como um sistema autônomo no campo da responsabilidade civil. Na Itália, na Bélgica e em outros países apareceram importantes trabalhos. A tese da responsabilidade objetiva encontrou seu mais propício campo doutrinário de expansão e de consolidação na França. Entre os autores que mais contribuíram se destacam Saleilles, Josserand, Ripert, Demoogue, Mazeaud e Mazeaud, Savatier e outros. Já no Brasil, destacam-se os nomes dos doutrinadores Alvino Lima, Agostinho Alvim, Aguiar Dias, Orlando Gomes, San Tiago Dantas, Washington de Barros Monteiro, além de inúmeros juristas de escol, como Clóvis Beviláqua, Costa Manso, A. Gonçalves de Oliveira, Orozimbo Nonato e outros. Destaca o referido autor49 que a Responsabilidade Civil Subjetiva é a regra do código, entretanto a Responsabilidade Civil Objetiva é adotada em vários dispositivos. Dentre eles, no diploma civil brasileiro, os arts. 936, 937 e 938, que tratam da responsabilidade do dono do animal, do dono do prédio em ruína e do habitante da casa da qual caírem coisas. E os arts. 929 e 930, que prevêem a responsabilidade por ato lícito (estado de necessidade). Ainda, os arts. 939 e 940, que disciplinam sobre a responsabilidade do credor que demanda o devedor antes de vencida a dívida ou por dívidas já pagas; o art. 933, trata sobre os pais, tutores, curadores e empregadores donos de hotéis e de escolas respondem, independentemente de culpa, pelos atos danosos de terceiros; o parágrafo único do art. 927, que dispõe sobre a obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar; devido sua natureza, risco pra os direitos de outrem. 48 49

GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p. 21-24. GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p. 21-24.

32

Ainda,

em

diversas

leis

esparsas,

a

tese

da

Responsabilidade Civil Objetiva foi utilizada, como, por exemplo: Lei n. 6.453/77 (que estabelece a responsabilidade do operador de instalação nuclear), Decreto legislativo n. 2.681, de 1912 (que regula a responsabilidade civil das estradas de ferro), Lei n. 6.938/81 (que trata dos danos causados ao meio ambiente), Código de

Defesa

do

Consumidor

entre

outras,

significando,

assim,

que

a

Responsabilidade Civil Objetiva não substituiu a subjetiva, mas se encontra circunscrita dentro de seus limites. Nesse sentido entende Sílvio Rodrigues50 a respeito a Responsabilidade Civil Objetiva: “Na responsabilidade objetiva a atitude culposa ou dolosa do agente causador do dano é de menor relevância, pois, desde que exista relação de causalidade entre o dano experimentado pela vítima e o ato do agente, surge o dever de indenizar, quer tenha este último agido ou não culposamente. A teoria do risco é a da responsabilidade objetiva. Segundo essa teoria, aquele que, através de sua atividade, cria risco de dano para terceiros deve ser obrigado a repará-lo, ainda que sua atividade e seu comportamento sejam isentos de culpa. Examinase a situação, e, se for verificada, objetivamente, a relação de causa e efeito entre o comportamento do agente e o dano experimentado pela vítima, esta tem direito de ser indenizada por aquele.”

No mesmo sentido Rogério Marrone de Castro Sampaio51 dispõe: “Distinção esta da maior importância para o estudo da responsabilidade civil, à medida que a adoção da responsabilidade objetiva é fruto da evolução das relações sociais, voltada a possibilitar àquele que, prejudicado em razão de determinado comportamento humano, possa ver seu dano reparado, restabelecendo-se uma situação de equilíbrio. (...)

50 51

RODRIGUES, Silvio. Direito civil: responsabilidade civil. p. 11. SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil: responsabilidade civil. p.26, 27 e 29

33

A responsabilidade civil objetiva, por sua vez, tem como característica determinante o fato de que o elemento culpa não é essencial para o surgimento do dever de indenizar. (...) A responsabilidade objetiva, impulsionada pelo Direito Francês, apenas ganhou corpo a partir do século XIX, quando, efetivamente, estruturada na teoria do risco. Prevalecendo a idéia de que todo dano, na medida do possível, deve ser indenizado, ganhou espaço no mundo jurídico a tese de que a obrigação de reparar o dano nem sempre está vinculada um comportamento culposo do agente. E, como fator justificador do surgimento da obrigação de indenizar, socorre-se, nesse caso da denominada teoria do risco. (...) O estudo da responsabilidade civil passa pela evolução da responsabilidade subjetiva ou clássica, adotada como regra na maioria dos ordenamentos jurídicos, até atingir a responsabilidade objetiva, incidente em hipótese especiais.”

Por fim, destaca sobre a adoção da Responsabilidade Civil no Código Civil atual: “Com o advento do novo Código Civil, em 2002, não houve rompimento com a estrutura passada. Foi mantida, como regra, a responsabilidade civil subjetiva, aplicando-se a objetiva a situações especiais”

Aduz, Pablo Stolze Gagliano52, sobre a coexistência da Responsabilidade Civil Subjetiva com a Objetiva: “(...) a nova concepção que deve reger a matéria no Brasil é de que vige uma regra geral dual de responsabilidade civil, em que temos a responsabilidade subjetiva, regra geral inquestionável do sistema anterior, coexistindo com a responsabilidade objetiva, especialmente em função da atividade de risco desenvolvida pelo autor do dano (conceito jurídico indeterminado a ser verificado no

52

GAGLIANO, Pablo Stolze, PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. p.17

34

caso concreto, pela atuação judicial), ex vi do disposto no art. 927, parágrafo único”

Diante de tais entendimentos, verifica-se que é majoritária a opinião entre os doutrinadores sobre a Responsabilidade Civil Objetiva no sentido de que, para a caracterização dessa responsabilidade, não se faz necessária a caracterização da culpa do agente causador do dano e que para ser possível a exigência é que esteja impreterivelmente previsto na legislação. 1.4 EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE CIVIL Conforme

visto

anteriormente,

existem

pressupostos

ensejadores do dever de reparar o dano sofrido pela vítima, entretanto, há outros que, se presentes no caso concreto, podendo isentar ou atenuar o causador do dano do dever de reparar. Conceitua as causas de excludente de responsabilidade civil Pablo Stolze Gagliano53: “Como causas de excludentes de responsabilidade devem ser entendidas todas as circunstâncias que, por atacar um dos elementos ou pressupostos gerais da responsabilidade civil, rompendo o nexo causal, terminam por fulminar qualquer pretensão indenizatória.”

Pablo Stolze Gagliano54 classifica as excludente em, 1) estado de necessidade; 2) legítima defesa; 3) exercício regular de direito e estrito cumprimento de um dever legal; 4) caso fortuito e força maior; 5) culpa exclusiva da vítima; 6) fato de terceiro. Identificar-se-ão, agora, as excludentes supramencionadas. 1) Estado de necessidade.

53

GAGLIANO, Pablo Stolze, PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. p.112 54 GAGLIANO, Pablo Stolze, PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. p.111.

35

O estado de necessidade encontra-se previsto no art. 188, II e parágrafo único do Código Civil, bem como nos arts. 929 e 930 do mesmo diploma legal. Art. 188, II e parágrafo único, assim dispõe: “Não constituem atos ilícitos: II – a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão a pessoa, a fim de remover perigo iminente. Parágrafo único. No caso do inciso II, o ato será legítimo somente quando as circunstâncias o tornarem absolutamente necessário, não excedendo os limites do indispensável para a remoção do perigo” Rogério Marrone de Castro Sampaio55 explica que o estado de necessidade, conforme acima apresentado, não difere do previsto no Código Penal. Entretanto, segundo o mesmo autor, o estado de necessidade não aparece, em geral, como excludente de responsabilidade civil, visto que a obrigação de indenizar à vítima permanece, salvo se esta não tenha sido a causadora da situação de perigo. Contudo, cria o direito de regresso ao que agiu na situação dessa excludente em face do real causador do dano. Nesse diapasão, Pablo Stolze Gagliano56 exemplifica e comenta: “É o caso do sujeito que desvia o seu carro de uma criança, para não atropela-la, e atinge o muro da casa, causando danos materiais. Atuou nesse caso, em estado de necessidade. Note-se, entretanto, que, se o terceiro atingido não for o causador da situação de perigo, poderá exigir indenização do agente que houvera atuado atuado em estado de necessidade, cabendo a este ação regressiva contra o verdadeiro culpado (o pai do bebê que o deixou sozinho por exemplo) (...)”

55

SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil: responsabilidade civil. p.95. GAGLIANO, Pablo Stolze, PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. p.113

56

36

Conclui-se, portanto, que o estado de necessidade não exime o agente de responsabilidade, gerando para ele apenas o direito à ação regressiva contra o causador do perigo, já que, em oposição ao fato de terceiro, não descaracteriza o nexo de causalidade, vez que o terceiro apenas provocou o perigo, sendo o dano efetivamente realizado pelo agente causador do dano propriamente dito. 2) Legítima defesa. A legítima defesa encontra-se prevista no art. 188, I do Código Civil, conforme se transcreve: “art. 188. Não constituem atos ilícitos: I – os praticados em legítima defesa ou exercício regular de um direito;”

Pablo Stolze Gagliano57 explana que, para caracterizar legítima defesa o indivíduo deve encontrar-se frente a uma situação atual ou iminente de injusta agressão, sendo para si ou para outrem, que não está obrigado a suportar. Ressalva-se que, em caso de excesso cometido pelo agente, atingir direito de um terceiro inocente, esta excludente não se aplica, devendo o agente indenizar, cabendo, nesse último caso, ação regressiva ao verdadeiro agressor. Desta

forma,

entende

Rogério

Marrone

de

Castro

Sampaio58: “Conclui-se, portanto, que como excludente de responsabilidade civil, tem-se, apenas a legítima defesa real (compreendida a legítima defesa de terceira pessoa) e praticada contra a pessoa do agressor, causando-lhe danos. Isto quer dizer que, se por erro ou engano, terceira pessoa também for atingida, persistirá, diante dela, o dever de repara o dano. O mesmo cuidado se deve tomar com a legítima defesa putativa (derivada de erro sobre a

57

GAGLIANO, Pablo Stolze, PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. p.114 – 116. 58 SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil: responsabilidade civil. p.96.

37

circunstâncias de fato). Nesse caso, tal comportamento mantém o caráter ilícito, à medida que tal putatividade não surge como excludente de ilicitude, mas de culpabilidade.”

Desta feita, ocorre a excludente em comento somente quando presentes os pressupostos da legítima defesa. Ressalva-se que, recaindo o dano sobre pessoa diversa da que provocar a agressão ou ameaça, não se pode conceber a presente causa de exclusão de responsabilidade, neste caso há possibilidade de direito de regresso, quanto à legítima defesa putativa, na qual a reação é suposta, já que não há agressão ou ameaça concreta não exclui a responsabilidade de indenizar. 3) Exercício regular de direito e estrito cumprimento de um dever legal. Essas excludentes de responsabilidade têm por esteio, segundo Pablo Stolze Gagliano59, a idéia de dar segurança aos que estão incumbido de um direito ou no cumprimento de um dever legal, entretanto, não são tolerados excessos torna o ato ilícito, o que descaracteriza as excludentes, devendo os agentes reparar o dano causado, visto que, ocorrendo excesso, ocorre o abuso de direito disciplinado no art. 187 do Código Civil. Sobre o assunto discorre Rogério Marrone de Castro Sampaio60: “Destaca-se apenas porque maior a incidência prática que os danos causados por agentes no desempenho de serviço público, ainda que por delegação, mesmo que no estrito cumprimento do dever legal, são indenizáveis pelo Estado ou pelas pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público.”

Diante de tais entendimentos, observa-se que, para a configuração de tais excludentes, a conduta do agente deve ser moderada.

59

GAGLIANO, Pablo Stolze, PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. p.117 – 121. 60 SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil: responsabilidade civil. p.97.

38

Assim, havendo excessos no exercício do direito ou no cumprimento do dever legal, o ato será ilícito, surgindo o dever de indenizar. 4) Caso fortuito e força maior. Essas excludentes de Responsabilidade Civil encontram-se previstas no art. 393 do Código Civil, que assim dispõe: “O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizados. Parágrafo único. O caso fortuito ou força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir”

Essas excludentes são de grande relevância, tendo em vista a grande incidência na prática. As duas não consistem em acontecimentos alheio à vontade do agente, sendo que os próprios acontecimentos são responsáveis pelo dano causado, excluindo a responsabilidade do agente. Haja vista a semelhança entre caso fortuito e força maior, essas possuem características diferenciadas. Maria Helena Diniz61 distingue força maior de caso fortuito, sendo que a força maior é oriunda de fatos da natureza, que impede o cumprimento de uma obrigação e por conseqüência ocasiona prejuízos a uma das partes. Já no caso fortuito, são prejuízos causados por causas desconhecidas ou por fato de terceiros. Nesse sentido, Silvio Rodrigues62 apresenta a seguinte distinção entre o caso fortuito e força maior: “(...) se nos adstringimos apenas ao campo da responsabilidade aquiliana, poderíamos afirmar que o caso fortuito ou força representa uma causalidade entre o ato do agente e o dano experimentado pela vítima. Assim, por exemplo, se forte temporal faz com que o isolador se desprenda e a vítima, que esbarra no fio

61 62

DINIZ, Maria Helena. Direito civil brasileiro: responsabilidade civil. p. 105. RODRIGUE, Silvio. Direito civil: responsabilidade civil. p.174 e 175.

39

elétrico, venha a ser eletrocutada, não se pode inculpar ninguém, e, por conseguinte, não têm os seus herdeiros ação de ressarcimento, visto que o fato derivou de caso fortuito. (...) A excludente de força maior é a mais importante de quantas haja, justamente por tirar a relação de causa e efeito entre o ato do agente, que diretamente provocou o prejuízo, e o dano experimentado pela vítima.”

Já, Rogério Marrone de Castro Sampaio63 assevera que, se a responsabilidade for de natureza contratual, fundamentada na culpa, comprovada o caso fortuito para exonerar o devedor. Entretanto, se a obrigação for fundamentada na teoria do risco, somente a força maior poderá exonerá-lo da obrigação. Portanto, denota-se que a isenção de responsabilidade pelos danos causados por caso fortuito e força maior tem por esteio o fato de que, se a obrigação de ressarcimento dá-se em decorrência de acontecimento que escapa ao poder do agente, haja vista sua gênese em um fator estranho, a conseqüência lógica é o afastamento da reparação dos danos. 5) Culpa exclusiva da vítima. No caso de culpa exclusiva da vítima, exclui-se qualquer responsabilidade do causador do dano. A vítima deverá arcar com todos os prejuízos, pois o agente que causou o dano é apenas um instrumento do acidente, não se podendo falar em nexo causal entre sua ação e a lesão. Pablo Stolze Gagliano64 assim define e exemplifica a culpa exclusiva da vítima: “A exclusiva atuação culposa da vítima tem também o condão de quebrar o nexo de causalidade, eximindo o agente da responsabilidade civil. 63

SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil: responsabilidade civil. p.93. GAGLIANO, Pablo Stolze, PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. p.126.

64

40

Imagine a hipótese do sujeito que, guiando o seu veívulo seguindo as regras de trânsito, depara-se com alguém que, visando suicidar-se, arremessa-se sob as suas rodas. Nesse caso, o evento fatídico, obviamente, não poderá ser atribuído ao motorista (agente), mas sim, e tão somente ao suicida (vítima).”

Entretanto, levanta Rogério Marrone de Castro Sampaio65 a possibilidade da culpa concorrente, que é quando o agente e a vítima possuem suas parcelas de culpa no resultado, nesse caso não ocorre a quebra total do nexo de causalidade, apenas seus enfraquecimento, ocorrendo a compensação de reparação de acordo com o grau da culpa das partes. Desta forma, entende Maria Helena Diniz66: “(...) se a vítima e o ofensor causaram culposa e conjuntamente o mesmo dano, caso em que se terá compensação de reparações. As suas responsabilidades se neutralizam e se compensam se as suas partes estiverem em posição igual, logo, não haverá qualquer indenização por perdas e danos. Entretanto se estiverem em situação desigual, por haver gradatividade na culpa de cada um, ter-se-á uma condenação das perdas e danos proporcional à medida da culpa que lhe for imputável.”

6) Fato de terceiro. Como o próprio nome já infere, essa excludente ocorrerá quando o dano causado for ocasionado por um terceiro, quebrando assim o nexo de causalidade, e, em conseqüência isentando o agente de reparar o dano. Nesse contexto, Maria Helena Diniz67 define fato de terceiro: Por culpa de terceiro, isto é, de qualquer pessoa além da vítima ou do agente, de modo que, se alguém for demandado para indenizar um prejuízo que lhe foi imputado pelo autor, poderá pedir a exclusão de sua responsabilidade se a ação que provocou o dano foi devida exclusivamente a terceiro. 65

SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil: responsabilidade civil. p.90. DINIZ, Maria Helena. Direito civil brasileiro: responsabilidade civil. p.104. 67 .DINIZ, Maria Helena. Direito civil brasileiro: responsabilidade civil. p.104 66

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Mais a diante destaca: Para que ocorra a força exoneratória do fato de terceiro, será imprescindível: 1) um nexo de causalidade, isto é, que o dano se ligue ao fato de terceiro por uma relação de causa e efeito (RJTJSP, 21:50); logo não poderá haver liame causam entre o aparente responsável e o prejuízo causado à vítima; 2) que o fato de terceiro não haja sido provocado pelo ofensor, pois a responsabilidade do ofensor será mantida se ele concorrer com a do terceiro, salvo se o ofensor provar que houve culpa exclusiva de terceiro (RJTJSP, 40:50; RT, 429:260, 523:101, 437:240; Súmula 187 do STF); 3) que o fato de terceiro seja ilícito; 4) que o acontecimento seja normalmente imprevisível e inevitável, embora não seja necessária a prova de sua absoluta irresistibilidade e imprevisibilidade.

Entretanto, segundo Pablo Stolze Gagliano68, não é pacífico esse entendimento, tendo em vista a súmula 187 do Supremo Tribunal Federal, que trata da responsabilidade contratual do transportador, pela qual, no acidente com o passageiro, não é ilidida por culpa de terceiro, devendo indenizar a vítima, desencadeando somente o direito de regresso. Nesse diapasão, discorre Rogério Marrone de Castro Sampaio69: Já na esfera da responsabilidade civil contratual, o interesse do tema acentua-se nos casos de responsabilidade do transportador. Como já visto, adotada que foi a responsabilidade civil objetiva, tem-se como regra que a culpa de terceiro não exonera o transportador pelos danos causados ao passageiro transportado.

Portanto, conforme se vislumbra dos entendimentos supra citados, o fato de terceiro se caracteriza como causa de escusa do dever de reparar o dano sofrido pela vítima quando, para o advento desse, não sobrevier o menor resquício de culpa por parte de agente ou daquele que sofrer o prejuízo imposto pelo fato danoso, sendo, assim, imprevisível e inevitável para ambas as partes. Pode-se por outro lado, ser imputada ao terceiro interveniente a

68

GAGLIANO, Pablo Stolze, PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: responsabilidade civil. p.128 – 130. 69 SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil: responsabilidade civil. p.91.

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responsabilidade pelo evento danoso, ressalvado os casos de responsabilidade objetiva. Visto

as

breves

considerações

a

respeito

da

Responsabilidade Civil, no próximo capítulo, abordar-se-á as espécies de Contratos

de

Transporte

e

suas

relações

internacionais.

CAPÍTULO 2

CONSIDERAÇÕES SOBRE OS CONTRATOS DE TRANSPORTE E SUAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS 2.1 CONCEITO DE CONTRATO DE TRANSPORTE O Contrato de Transporte é de grande importância, visto que através dele o transportador se obriga a transportar as mercadorias ou pessoas, de maneira adequada e responsável. Roberto Senise Lisboa70 conceitua contrato de transporte como “o contrato por meio do qual uma pessoa física ou jurídica (transportadora) se obriga a conduzir pessoas ou coisas para determinado destino, mediante o pagamento respectivo do interessado”. Maria Helena Diniz71 conceitua o Contrato de Transporte: [...] é aquele em que uma pessoa ou empresa se obriga, mediante retribuição, a transportar, de um local para outro, pessoas ou coisas animadas ou inanimadas (CC, art. 730). A empresa de transporte, pessoa física ou jurídica, está apta à oferta e à prestação de serviços de deslocamento de pessoas e de mercadorias por via terrestre, aquaviária, ferroviária e aérea, mediante contratos celebrados com os respectivos usuários, revestindo-se para tanto de forma empresarial, quer em nome individual, quer em nome coletivo, e assumindo os riscos decorrentes desse empreendimento.

Quanto à classificação, Orlando Gomes72 considera que “o contrato de transporte é bilateral, simplesmente consensual e oneroso”. Aduz ainda o mesmo autor, que dele nascem obrigações para as duas partes, sendo a

70

LISBOA, Roberto Senise. Manual de direito civil: contratos e declarações unilaterais: teoria geral e espécies. v.III. 3 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005 p. 508. 71 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. v. III, 18 ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 417. 72 GOMES, Orlando. Contratos. 24 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 306.

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de prestar serviço aquela contraída pelo transportador e a de pagar, a ajustada pelo contratante. Silvio Venosa73 entende que o “contrato de transporte é o negócio pelo qual um sujeito se obriga, mediante remuneração, a entregar coisa em outro local ou a percorrer um itinerário para uma pessoa”. No entanto, ressalva ainda o mesmo autor, que se deve distinguir o contrato de transporte propriamente dito, em que como o objetivo principal do seu ato negocial é o translado de uma coisa ou pessoa, da relação de transporte acessória de outro negócio. Entretanto, quando o transporte de pessoas ou coisas figurar como assessório, por exemplo, em um contrato de compra e venda, em que o vendedor se obriga a entregar a coisa, este não se qualifica como transportador, não se submetendo, portanto, a seus riscos específicos, restando a ele as normas que se aplicam à compra e venda. Contudo, como se pode perceber dos entendimentos anteriormente expostos, o Contrato de Transporte é consensual, bilateral, tem por objetivo principal o transporte de pessoas ou coisas. 2.2 ESPÉCIES DE CONTRATOS DE TRANSPORTE O Contrato de Transporte, segundo Silvio Venosa74, dividese em transporte de pessoas e coisas. Tem conceito unitário e se diferencia de acordo com a natureza do objeto, já que sua finalidade é o deslocamento de um local para outro. Ressalta ainda o mesmo autor que o transportador deverá propiciar todas as condições para que a pessoa ou a coisa transportada tenha totais condições de transporte e não chegue danificada.

73

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécies. v. III, 4 ed. São Paulo: Atas, 2004. p. 490. 74 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécies. p. 495.

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Já Maria Helena Diniz75 vai além da classificação das espécies de Contratos de Transporte de Pessoa e Contrato de Transporte de Coisas. Leva em conta o meio empregado, subdividindo em: a) Transporte terrestre, que sofre uma nova subdivisão em função de veículo utilizado ferroviário e rodoviário, ou em função da extensão coberta, - urbano, intermunicipal, interestadual e internacional; b) Transporte aquaviário, marítimo ou fluvial e c) Transporte aéreo. Portanto, verifica-se de maneira clara que as espécies de Contratos de Transporte, hoje, são o de pessoas ou de coisas, adotando-se regras específicas, como será visto a seguir. 2.2.1 Contrato de Transporte de Pessoas O Contrato de Transporte de Pessoas é regulado pelo Código Civil nos artigos 734 usque 742. Maria Helena Diniz76 define: “o contrato de transporte de pessoas é aquele em que o transportador se obriga a remover uma pessoa e sua bagagem de um local para outro, mediante remuneração”. Já Roberto Senise Lisboa77 entende que: “Transporte de pessoas é aquele que decorre da condução de passageiros, acompanhados ou não de bagagem, com bilhete expedido pelo transportador ou terceiro por ele autorizado”. Já Silvio de Salvo Venosa78 ensina no sentido de que: A regra geral é no sentido de que o transporte de pessoas é um serviço público, um direito constitucional do indivíduo em se locomover. Nesse sentido, o transportador não poderá recusar passageiro, salvo, é evidente, a hipótese descrita acima, os casos 75

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. p. 418 - 420. 76 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. p.435. 77 LISBOA, Roberto Senise. Manual de direito civil: contratos e declarações unilaterais: teoria geral e espécies. p. 509. 78 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécies. p.501.

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previstos nos regulamentos, ou se as condições de higiene ou de saúde do interessado o justifiquem (art. 739).

Diante de tais entendimentos, percebe-se que o majoritário é que o Contrato de Transporte de Pessoas tem como pressuposto, além do transporte de seres humanos, também de suas bagagens. Porém ressalta Maria Helena Diniz79 que não caracteriza Contrato de Transporte de Pessoas o realizado gratuitamente, por amizade ou cortesia, desde que esse favor não venha beneficiar, mesmo que indiretamente, o Transportador. Segue esse entendimento Silvio de Salvo Venosa80: Somente deve ser considerado transporte gratuito aquele totalmente desinteressado, sem direito algum à retribuição pecuniária. É o transporte benévolo ou amistoso, que se funda na amizade ou cortesia e não decorre de dever ou obrigação. Não é gratuito, pois se apresenta agregado a outro contrato oneroso ou como acessório de uma prestação de serviços.

Maria Helena Diniz81 aduz que o Contrato de Transporte de Pessoas pode ser subdividido em três modalidades, ou seja, terrestre, marítimo e aéreo, que serão regidos por normas especiais por força de regulamentos que se subordinam, porém apresenta semelhanças no que concerne aos requisitos essenciais da formação dos contratos. Vale ressaltar, segundo a mesma autora, que na modalidade do Contrato de Transporte de Pessoas, são contraentes de obrigação ambas as partes: o transportador se obriga a transportar e o passageiro se propõe a ser transportado, mediante remuneração. No entanto, outra característica importante reside na capacidade das partes. No contrato de transporte de pessoas, pode figurar como

transportado o

incapaz, ressalvado

quando obrigatório

o

acompanhamento de uma pessoa maior responsável pelo incapaz, ou quando necessária autorização judicial.

79

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. p. 435 e 436. 80 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécies. p. 501. 81 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. p. 436 e 437.

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Conforme Caio Mário da Silva Pereira82, inovou o novo Código Civil de 2002 ao responsabilizar o transportador, mesmo quando atribuído a fato de terceiro, restando somente admitida a excludente de responsabilidade civil quando causada por força maior, fixado no art. 735. Nesse sentido, manifesta-se Carlos Roberto Gonçalves83: Ocorrendo um acidente de transporte, não pode o transportador, assim, pretender eximir-se da obrigação de indenizar o passageiro, após haver descumprido a obrigação de resultado tacitamente assumida, atribuindo culpa ao terceiro (p. ex., ao motorista do caminhão que colidiu com o ônibus). Deve, primeiramente, indenizar o passageiro para depois discutir a culpa pelo acidente, na ação regressiva movida contra o terceiro.

Maria Helena Diniz84 esclarece que o bilhete de passagem emitido pela transportadora é um título de legitimação que representa o contrato, porém, caso ocorra perda, falha ou irregularidade não extingue a obrigação gerada entre as partes, visto que há, também, a possibilidade de o transportador não emitir o bilhete. Desta forma ressalta Caio Mário da Silva Pereira85: Via de regra, o transportador emite um documento que constitui o instrumento do contrato. Para o transporte de pessoas, chama-se bilhete de passagem, que pode ser pessoal ou impessoal; no primeiro caso é intransferível, e no segundo dá direito a condução de qualquer pessoa. Não é, todavia, obrigatória a sua emissão. Muitas modalidades de condução se realizam, com características contratuais, à simples admissão do passageiro no veículo, mediantes pagamento, adiantado ou não. Quando o transportador emite o bilhete de passagem, é comum fazer inscrever nele normas contratuais a serem obedecidas pelo passageiro. É evidente que as normas que sejam abusivas considerar-se-ão 82

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil: contratos, declaração unilateral de vontade, responsabilidade civil. vol. III. 11 ed. Rio de Janeiro: Forense – 2004 p. 330. 83 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. Vol. III. São Paulo: Saraiva – 2004. p.460. 84 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. p. 437. 85 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil: contratos, declaração unilateral de vontade, responsabilidade civil. p. 331.

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como não escritas, especialmente quando o contrato de transporte se der no âmbito de relação de consumo. Mesmo sem a emissão pode o transportador estabelecer normas, cujo conhecimento pelo passageiro se dá quando se encontrarem afixadas em locais visíveis (Código Civil, art. 738).

Importante discorrer, mesmo que de maneira sucinta, sobre as agências de turismo, considerando que essas empresas celebram diariamente Contratos de Transporte de Pessoas, segundo Maria Helena Diniz86, intermediam grande parte das vendas de passagens aéreas entre a transportadora e os passageiros, promovem o deslocamento de pessoas no âmbito nacional e internacional e auxiliam os passageiros em serviços correlatos à venda de passagens e de turismo. Maria Helena Diniz87 assim define as funções das agências de viagens: A agência de viagens terá a função de: vender excursões e passagens por conta própria ou de empresas de transporte; organizar, promover e executar viagens ou excursões individuais ou coletivas; prestar, mediante remuneração, serviços turísticos, inclusive de guia, intérprete, prestando informações a viajantes; prestar serviços especializados, mediante remuneração, relacionados com passeios, viagens, acomodações em hotéis.

No entanto, Roberto Senise Lisboa88 ensina que “a responsabilidade civil das operadoras ou agências de turismo é objetiva”. Desta forma, responderá por todos os danos patrimoniais e morais, solidariamente, podendo os danos morais ser imputados somente em face dos causadores do prejuízo. No que se refere à quantificação da indenização por danos materiais, o Código Civil no parágrafo único do art. 734, dispõe sobre o direito do transportador de exigir a declaração do valor da bagagem, sendo assim, segundo 86

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. p. 439. 87 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. p. 439. 88 LISBOA, Roberto Senise. Manual de direito civil: contratos e declarações unilaterais: teoria geral e espécies. p. 521.

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Caio Mário da Silva Pereira89, existindo essa declaração, torna-se mais fácil fixar a indenização por danos materiais, restando somente ao magistrado a apreciação do eventual dano moral ocorrido. Entretanto, caso o passageiro venha a transgredir as normas estabelecidas pelo transportador, o magistrado deverá julgar de acordo com o grau de culpa de cada um, visto que o passageiro pode concorrer para a ocorrência do dano causado. Contudo, muito embora o Código Civil não estabeleça, há a possibilidade de se atribuir a culpa exclusiva ao passageiro, o que exime o transportador da responsabilidade civil sobre o dano causado. Carlos Roberto Gonçalves90 segue o mesmo entendimento e acrescenta: De acordo com o Decreto n. 2.681, de 1912, a culpa concorrente da vítima não exonera o transportador da obrigação de compor os danos. Somente a culpa exclusiva da vítima pode exonerá-lo. O Código de Defesa do Consumidor manteve o princípio da responsabilidade objetiva do prestador de serviços, admitindo como excludentes somente a comprovada inexistência do defeito e culpa exclusiva da vítima ou de terceiro (art. 14, § 3º), que rompem o nexo causal (sendo admissível, pelo mesmo motivo, a força maior).

O art. 740 e parágrafos do Código Civil, trata do direito do passageiro de restituição do valor da passagem no caso de desistência, se comunicado ao transportador antes de iniciada a viagem, para o transportador renegociar o bilhete, ou durante a viagem, neste caso restituindo o passageiro somente o trecho que não foi transportado, se no trecho desistido, o lugar for ocupado por outro passageiro. Ressalvado o direito do transportador de reter o valor de 5% do valor a ser restituído a título de multa compensatória no que ser refere aos casos de restituição anteriormente expostos. A esse respeito, Silvio de Salvo Venosa91 entende, que o prazo para desistência deve ser regulamentado por legislação específica e 89

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil: contratos, declaração unilateral de vontade, responsabilidade civil. p. 331 e 332. 90 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. p. 462 91 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécies. p. 501 e 502.

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exemplifica com o prazo de 24 ou 48 horas antes da data do embarque, visto que se avisado somente no momento do embarque, ocasionaria grandes prejuízos ao transportador. Ressalta, os casos que o transportador vende mais bilhetes do que deveria, nesses casos deve o transportador propiciar o passageiro outro transporte de mesma espécie e qualidade e dependendo do caso, indenizar o passageiro. Reforça ainda que, nos casos em que for exigida a produção de prova (§ 1º), será aplicado o Código de Defesa do Consumidor. Por fim, entende que a multa compensatória poderá ser exigida nos casos em que o transportador não incorrer em culpa. No art. 741 do Código Civil, se encontra novamente caracterizada a responsabilidade objetiva do transportador em levar o passageiro até o destino final, face aos fatos imprevisível em que impeça o transportador de concluir a viagem. Para Caio Mário da Silva Pereira92, o transportador não será eximido da responsabilidade de concluir a viagem contratada pelo passageiro, mesmo que tenha que ser por meio diverso do contratado, neste caso com a anuência do passageiro, visto que não se admite cláusula de excludente de responsabilidade, conforme o previsto na segunda parte do art. 734 do mesmo diploma legal. Por fim, preconiza o art. 742 do Código Civil, o direito do transportador de reter a bagagem, bem como outros objetos pessoais a fim de garantir o pagamento do valor passagem, quando não realizado em nenhum momento pelo passageiro. Ao se identificar esse artigo, percebe-se a similaridade com o penhor legal realizado pelos hoteleiros. Contudo, conforme Silvio de Salvo Venosa93, não se trata de penhor legal, “mas de um direito procedimental de retenção sobre a bagagem do passageiro, que poderá ser alegado também como matéria de defesa, enquanto não for pago o valor da passagem”.

92

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil: contratos, declaração unilateral de vontade, responsabilidade civil. p. 330. 93 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécies. p. 503.

51

Portanto, diante de todo o exposto no que condiz o Contrato de Transporte de Pessoas, percebe-se que o Código Civil expõe, de maneira clara, as regras que regem esse tipo de contrato, visto que, se fixa a responsabilidade objetiva do transportador, em contrapartida permite ao julgador ponderar as decisões quando houver culpa concorrente ou exclusiva do passageiro. 2.2.2 Contrato de Transporte de Coisas O Contrato de Transporte de Coisas vem disciplinado no Código Civil do art. 743 ao 756 e segundo Silvio de Salvo Venosa94, o Código Civil traça regras gerais, visto que “não se conflitam com os princípios criados pelos usos e costumes mercantis”. Para Caio Mário da Silva Pereira95: “No contrato de transporte de coisas o transportador obriga-se, essencialmente, a conduzir a coisa de um local para outro, e entregá-la em seu destino, em tempo certo e previamente estabelecido”. Maria Helena Diniz96, conceitua o Contrato de Transporte de Coisas como: (...) aquele em que o expedidor ou remetente entrega ao transportador determinado objeto lícito para que, mediante pagamento de frete, seja remetido a outra pessoa (consignatário ou destinatário), em local diverso daquele em que a coisa foi recebida.

Nessa relação contratual, segundo a mesma autora, figuram como partes na relação contratual o remetente e o transportador, visto que o destinatário somente terá o direito de receber a mercadoria.

94

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécies. p. 504. PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil: contratos, declaração unilateral de vontade, responsabilidade civil. p. 330. 96 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. p. 420. 95

52

Já, Carlos Roberto Gonçalves97 entende que, no Contrato de Transporte de Coisas figura também como parte o destinatário ou consignatário, pessoa a quem é destinada. Os arts. 743 e 744 do Código Civil disciplinam a respeito da descrição dos objetos a serem transportados, que será realizado pelo remetente; do conhecimento de transporte emitido pelo transportador ao receber a coisa, bem como da exigência da lista das mercadorias a serem transportadas pelo transportador. Caio Mário da Silva Pereira entende que, as coisas a serem transportadas devem estar devidamente caracterizadas a fim de não confundir com as demais, efetivando sua individualização com o conhecimento de transporte emitido pelo transportador, que deverá conter os dados do remetente, transportador e destinatário. A respeito do conhecimento de transporte Silvio de Salvo Venosa98 ensina que o transportador deverá entregar ao remetente, que por sua vez remeterá ao destinatário e ainda: Não é documento essencial para todo contrato de transporte. Vários diplomas legais a ele se referem, dependendo de cada modalidade de transporte, estando fragmentada sua legislação. Como vimos, o vigente Código também se refere ao documento em várias oportunidades. De fato, sua existência faz presumir, até prova em contrário, a conclusão do contrato, o recebimento da carga e as condições do transporte. O Código Comercial regulamentou-o quando da disciplina do transporte marítimo. O Decreto nº 17.473/30 disciplinou-o de forma genérica, para todas as modalidades de transporte.

O art. 745 do Código Civil trata do dever de indenizar quando o remetente fornecer informações inexatas ou falsa descrição a respeito da coisa a ser transportada, bem como fixa o prazo decadencial para o transportado requerer judicialmente.

97 98

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. p. 463. VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécies. p. 507.

53

Desta forma, exemplifica Maria

Helena Diniz99:

“(...)

expedidor, que escondendo tratar-se de inflamável, causou incêndio no veículo. O condutor deverá para tanto mover ação dentro de cento e vinte dias, a contar daquele ato, sob pena de decadência (CC, art. 745)”. E ainda cita em sua obra, a opinião de Nelson Nery Jr. E Rosa Mª A. Nery, que seguem a corrente que o prazo fixado pelo artigo em comento não é decadencial, mas prescricional, por tratar-se de ação com pretensão condenatória. Os arts. 746 e 747 do Código Civil tratam da recusa do transportador em transportar a carga, quando não estiver adequadamente embalada e trazer risco a saúde das pessoas ou danificar o veículo, bem como outros bens ou quando não permitida por lei ou venha desacompanhado da lista com a descrição dos objetos a serem transportados. Carlos Roberto Gonçalves100 explica que é necessário que a coisa a ser transportada deve vir devidamente descriminada não só para que tome as providências necessárias a fim de promover o transporte, mas que possa exercer o direito de recusa em transportar a coisa. O remetente, segundo o art. 748 do Código Civil, tem o direito de requerer de volta a coisa dada em transporte ou dar novo destino, entretanto, deverá indenizar as despesas que ocasionarem o novo deslocamento, bem como perdas e danos se ocorrem. É dever do transportador conduzir com cautela a coisa para que não ocorra dano e entregar dentro do prazo previamente acordado, conforme o art. 749 do Código Civil, pois a responsabilidade do transportador se dá no momento em que recebe a coisa e termina quando for entregue ao destinatário ou depositada em juízo, quando este for o caso. No entanto, o valor da indenização terá como teto o constante no conhecimento de transporte, conforme art. 450 do Código Civil, estendendo também, a responsabilidade quando a coisa estiver

99

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. p. 433. 100 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. p. 464.

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depositada em armazém do transportador por for força contratual, o que seguirá as regras do contrato de depósito, art. 751 do Código Civil. Neste sentido entende Caio Mário da Silva Pereira101: O transportador, enquanto mantém consigo a coisa transportada, assume os riscos a ela inerentes. A sua obrigação essencial consiste em conduzir a coisa ao seu destino intacta no prazo concertado entre as partes (art. 749). Se a coisa estiver em seu poder, é por ela responsável, mesmo que não estiver sendo transportada, mas simplesmente guardada em seu galpão ou armazém, hipótese em que o Código lhe atribui a responsabilidade inerente ao contrato de depósito (art. 751). A responsabilidade do transportador é limitada sob o ponto de vista do dano material ao valor que tiver sido atribuído à coisa no conhecimento, e se inicia no momento em que ele a recebe para o transporte e somente finda quando ocorre a entrega ao destinatário, ou, quando não for encontrado, ao próprio remetente ou a pessoa por ele indicada. Na hipótese em que o transportador não encontrar o destinatário que tiver sido apontado no conhecimento, ou este se recusar a receber a coisa, ou mesmo ter dúvida sobre quem deva efetivamente entregá-la, deve tomar as providências necessárias para depositar o bem em Juízo, a fim de eximir da sua responsabilidade pelos riscos de perecimento ou danos a coisa.

Contudo,

segundo

Carlos

Roberto

Gonçalves102,

em

incorrendo em culpa do remetente em não informar qual o destino da coisa, este deverá indenizar o transportador o período em que a coisa estiver sob sua custódia. O art. 752 do Código Civil preconiza que, caso o remetente queira que o transportador avise o destinatário da chegada da coisa ou se a entrega for no domicílio deste, deverá estar previamente acordado e descrito no conhecimento de embarque.

101

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil: contratos, declaração unilateral de vontade, responsabilidade civil. p. 334 e 335. 102 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. p. 466.

55

Entretanto, segundo Silvio de Salvo Venosa103, a forma a ser entregue a mercadoria transportada deverá ser previamente acordada pelas partes, constando no conhecimento de embarque o local de entrega, bem como se o transportador tem a obrigação ou não de avisar a chegada da mercadoria. Ressalta ainda o mesmo autor, as Incoterms (termos comerciais), muito utilizado no comércio internacional, ante a falta de uma legislação supranacional a Câmara de Comércio Internacional (CCI), criou cláusulas que tratam basicamente das questões referentes do local de entrega da mercadoria e a transferência da responsabilidade, do rateio das despesas, bem como das providências relativas aos documentos alfandegários e de fronteira. As Incoterms são representadas por siglas que, entende o autor, a simples inclusão das mesmas no contrato faz a compra e venda inserir-se no rol de obrigações internacionais criados pela CCI. Conforme o art. 753 e parágrafos, o transportador pode ser responsabilizado ou não, pelo perecimento ou deterioração da mercadoria transportada, no caso da inexecução do transporte ou se sofrer impedimento de fazê-lo por longo tempo, ressalvado motivo de força maior. Carlos Roberto Gonçalves104, atribui aos casos de força maior “obstrução da rodovia, suspensão do tráfego ferroviário, revolução, guerra ou algum fenômeno inevitável da natureza (...)”, e, sendo nesses casos o transportador deverá solicitar informação ao remetente a fim de nortear o transportador a tomar as devidas providências, sob pena de responder pelos danos causados a coisa. Caso o impedimento permanecer, sem culpa do transportador e em havendo silêncio por parte do remetente, o parágrafo primeiro faculta o transportador depositar a coisa em juízo ou vendê-la. Se o impedimento da conclusão do transporte da coisa for por culpa do transportador, este poderá depositar a coisa por sua conta e risco ou vendê-la, depositando o valor recebido. No entanto, deverá o transportador avisar o remetente do depósito ou da venda.

103 104

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécies. p. 506. GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. p. 466.

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O transportador, como se observou anteriormente, deve entregar a coisa no local descrito no conhecimento de transporte, emitido pelo transportador e entregue ao remetente que entrega ao destinatário devidamente endossado para que possa receber a coisa. No entanto, segundo o art. 754 do Código Civil, o destinatário tem o dever de, ao receber a coisa, conferi-la e apresentar reclamações no prazo de dez dias, salvo quando não perceptível a primeira vista ou dano parcial na coisa, desde que denunciado pelo mesmo prazo, a contar da data da entrega. Caio Mário da Silva Pereira105 entende que: Em princípio o destinatário que tem o ônus de buscar a coisa transportada após desembarcada no local de destino, no prazo que tiver sido ajustado entre as partes. Qualquer alteração de prazo deve evidentemente ser incontinenti informada ao remetente e ao destinatário.

Por fim, o Código Civil prevê a possibilidade do transporte ser realizado por mais de um transportador e sendo assim, caberá a responsabilização em todas as situações acima referidas a todos, ressalvado o direito de regresso entre eles. 2.3 FORMAS DE TRANSPORTE Para melhor visualização dos contratos de transportes em espécies, se faz necessário sucinta explanação a respeito das modalidades de transporte. Desta forma, Roberto Senise Lisboa106 classifica as modalidades de transporte: O contrato de transporte pode ser classificado, entre outras hipóteses: quanto ao meio de locomoção e quanto ao objeto.

105

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil: contratos, declaração unilateral de vontade, responsabilidade civil. p. 335. 106 LISBOA, Roberto Senise. Manual de direito civil: contratos e declarações unilaterais: teoria geral e espécies. p. 509 e 510

57

Sob o aspecto do meio de locomoção, o contrato de transporte pode ser: - terrestre, efetuado por veículos que são conduzidos sobre o asfalto, os trilhos ou terra. O transporte terrestre pode se dar: por meio de rodovia, por meio de ferrovia ou por meio de aerovia. - marítimo, tanto por embarcações de pequeno porte como por embarcações de médio e grande porte, que são conduzidas por vias lacustres, rios, mares e oceanos. - aéreo, efetuado por embarcações de pequeno, médio e grande porte, no espaço aéreo sobre a terra e sobre as águas.

Portanto, percebe-se que para que seja formalizado o contrato de transporte, primeiramente deve-se observar a modalidade a qual será aplicada, pois somente após essa informação se pode formalizar o contrato aplicando a legislação pertinente, como será visto a seguir. 2.3.1 Contrato de Transporte Terrestre Como observado anteriormente, o Contrato de Transporte Terrestre divide-se em rodoviário e ferroviário ou até mesmo por aerovias. No entanto, restringir-se-á este estudo somente no conceito do Transporte Rodoviário e o Ferroviário, eis que a pesquisa não tem por escopo o transporte terrestre. Segundo Paulo C. C. Mendonça e Samir Keedi107 , o transporte rodoviário internacional é aquele efetuado por caminhões e carretas normalmente ligando países limítrofes. Pode também ligar países que não possuem fronteiras entre si, passando por um terceiro país, desde que este o permita. E aduz ainda, que para viagens de curta e média distâncias, o modal rodoviário é o mais utilizado no comércio internacional de mercadorias. Dentre as suas principais características, pode–se citar: a) Simplicidade de funcionamento; 107

MENDONÇA Paulo C, KEEDI Samir. Transportes e seguros no comércio internacional. São Paulo: Editora Aduaneiras 1997. p.93.

58

b) Maior disponibilidade para embarques urgentes; c) Permite integrar regiões, mesmo as mais afastadas, bem como o interior do país; d) Vendas do tipo entrega porta a porta, trazendo maior comodidade para exportador e importador; e) Menor manuseio da carga, sendo o veículo lacrado no local de carregamento e aberto no local da entrega; f) Rapidez na entrega em curta distância; e) possibilidade de utilização de embalagens mais simples e de menor custo. Por fim, na óptica dos mesmos autores, o transporte rodoviário é peça fundamental, permitindo que a multimodalidade e a intermodalidade é peça fundamental, permitindo que a multimodalidade e a intermidalidade passam a ser realizadas. Apenas ele tem a capacidade interligar os diversos modais, abrangendo todo o percurso da mercadoria. Por via de regra, apresenta preços de frete mais elevados do que os modais ferroviário, portanto sendo recomendado para mercadorias de alto valor ou perecíveis. Não é recomendado para produtos agrícolas e granel, cujo custo é muito baixo para este modal. Neste sentido, funcionaria apenas para complementar os demais modais, entretanto não é isto o que ocorre na prática. Já no que ser refere ao transporte ferroviário internacional, Paulo C. C. Mendonça e Samir Keedi108 definem que aquele efetuado por vagões, puxados por locomotivos, sobre trilhos e com trajetos devidamente delineados, ou seja, não tem flexibilidade quanto a percursos e estão presos a caminhos únicos, o que pode provocar atrasos na entrega das mercadorias em caso de obstrução da ferrovia. Liga, normalmente, países limítrofes, podendo ser realizados também entre países que não façam fronteiras entre si, mas que apresentem condições

108

MENDONÇA Paulo C. KEEDI Samir. Transporte e seguros no comercio internacional. p.104.

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para tal, tanto em relação à distância quanto à viabilidade de custos e condições das ferrovias, cujo trânsito é realizado através de um terceiro ou terceiros países. Segundo Paulo C. C. Mendonça e Samir Keedi109: O transporte ferroviário não é tão ágil quanto o rodoviário no acesso às cargas já que as mesmas devem, em geral, ser levadas a ele. O Brasil tem aproximadamente 30.000 Km de ferrovias (contra 150.000 Km de rodovias), o que é muito pouco para um país com as nossas dimensões territoriais.

Portanto, consta-se que a malha rodoviária brasileira é muito superior a ferroviária, o que acaba dificultando bastante o seu uso. 2.3.2 Contrato de Transporte Aéreo Segundo Paulo C. C. Mendonça e Samir Keedi110, o contrato de transporte Aéreo tem como objeto o transporte realizado por em presas de navegação aérea, através de aeronaves de vários tipos e tamanhos, nacional e internacional e pode ser utilizado praticamente para todas as cargas, embora com limitações em relação ao marítimo, quanto à quantidade e especificação. Ainda, através da navegação aérea , pode-se atingir qualquer ponto do planeta, sendo esta opção interessante para cargas de alto valor ou de alta perecibilidade, ou amostras, que necessitam chegar rapidamente ao seu destino. Conforme Paulo C. C. Mendonça e Samir Keedi111, o transporte aéreo internacional é baseado nas normas da IATA (International Air Transport Association) e em acordos e convenções internacionais. As reservas para transporte de cargas podem ser feitas para um espaço na aeronave, para o espaço total ou ainda afretamento de aviões cargueiros. As reservas são 109

MENDONÇA Paulo C. KEEDI Samir. Transporte e seguros no comercio internacional. p. 104 110 MENDONÇA Paulo C. KEEDI Samir. Transporte e seguros no comercio internacional. p.30. 111 MENDONÇA Paulo C. KEEDI Samir. Transporte e seguros no comercio internacional. p.110 e 111.

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realizadas pelos expedidores diretamente com a companhia aérea ou através de um agente de carga IATA. Este modal se diferencia dos demais graças às seguintes características. a) Maior rapidez no transporte; b) Apropriado para o transporte de mercadorias de pouco peso/volume e alto valor; c) Usado particularmente com muita eficácia para transporte de amostras; d) Ideal para o transporte de mercadorias com prioridade de entrega e (urgência); e) AWB (Airway Bill) obtido com maior rapidez. 2.3.3 Contrato de transporte Marítimo, Lacustre e Fluvial 2.3.3.1 Marítimo O transporte marítimo é aquele realizado por navios em oceanos e mares e pode ser utilizado para qualquer tipo de carga, podendo aportar e descarregar em qualquer porto do mundo, sendo o único meio de transporte que transporta milhares de toneladas ou de metros cúbicos de qualquer produto de uma só vez112. De acordo com Paulo C. C. Mendonça e Samir Keedi113 O transporte Marítimo possui a seguinte divisão: a) Navegação de longo curso: que faz a ligação entre países próximos ou distantes a chamada navegação internacional; b) Navegação de cabotagem: que é aquela realizada entre os portos do mesmo país, a chamada navegação nacional.

112 113

MENDONÇA Paulo C. KEEDI Samir. Transporte e seguros no comercio internacional. p.28. MENDONÇA Paulo C. KEEDI Samir. Transporte e seguros no comercio internacional. p.29

61

2.3.3.2 Fluvial É a navegação praticada nos rios, dá-se dentro do país e/ou continente, nomeada como navegação de interligação de interior114. Como acontece no transporte marítimo, também pode haver transportes de qualquer carga e com navios de todos os tipos de tamanhos, desde que a via navegável os comporte115. 2.3.3.3 Lacustre Navegação lacustre é aquela realizada em lagos e tem como características a Ligação de cidades e países circunvizinhos. No entanto, tendo em vista que não existem muitos lagos navegáveis, é um tipo de navegação bastante restrita116. 2.4 REQUISITOS E ELEMENTOS DOS CONTRATOS DE TRANSPORTE O Contrato de Transporte tem como requisitos e elementos, segundo Jônatas Milhomens e Geraldo Magela Alves117, a bilateralidade, visto que gera obrigações para o transportador, como também para o passageiro ou expedidor, a onerosidade eis que ambas as partes contraem ônus em virtude da celebração do contrato, comutativo, pois as prestações adquiridas com a formalização do contrato são certas e determinadas e consensual, tendo em vista que a formalização do contrato depende somente da vontade das partes. Entretanto, Carlos Roberto Gonçalves118 argumenta que o além das características anteriormente expostas, o contrato de transporte é conhecido como contrato de adesão, visto que é de costume uma das partes não discutir o contrato, bem como há um regulamento previamente estabelecido. Exemplifica o autor com o transporte de ônibus, uma vez que o passageiro

114

MENDONÇA Paulo C. KEEDI Samir. Transporte e seguros no comercio internacional. p.29 MENDONÇA Paulo C. KEEDI Samir. Transporte e seguros no comercio internacional. p.29 116 MENDONÇA Paulo C. KEEDI Samir. Transporte e seguros no comercio internacional. p.29 117 MILHOMENS, Jônatas, ALVES, Geraldo Magela. Manual prático dos contratos. 8 ed. Rio de Janeiro: Forense – 2005. p. 428. 118 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. p. 452 e 453. 115

62

adquire a passagem e conseqüentemente adere a todas as cláusulas expostas no bilhete. Já Silvio de Salvo Venosa119, não classifica como contrato de adesão, no entanto acrescenta que se trata de contrato de duração, ante a necessidade de um lapso temporal para ser cumprido o respectivo contrato. Portanto,

constata-se

que

não

é

muito

pacífica

a

caracterização do Contrato de Transporte, entretanto, todos os autores concordam em ser o contrato de transporte bilateral, oneroso, comutativo e consensual. 2.5 AS CONVENÇÕES E TRATADOS INTERNACIONAIS ACERCA DOS CONTRATOS DE TRANSPORTE De acordo com o art. 732 do Código Civil poderá ser aplicável toda e qualquer legislação especial aos Contratos de Transporte, desde que não contrarie o disposto no mesmo. Levando-se em conta que os Contratos de Transporte podem ser entabulados para transporte de coisas ou pessoas, de ordem nacional e

internacional,

sendo

que,

nesse

último,

incidem

normas

de

cunho

supranacional, ou seja, são regulamentados por tratados e convenções internacionais. Os tratado e Convenções, segundo Rui Stoco120, “são acordos entre os Estados”, que segundo o mesmo autor, são celebradas convenções internacionais, quando seu objeto for de menor importância e a durabilidade for por prazo menor do que estabelecido por um tratado. De acordo com o art. 84, VIII da Constituição Federal, o Presidente da República é a pessoa competente para celebrar entre os Estados

119

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: contratos em espécies. p. 494. STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. 6.ed. rev. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 422. 120

63

os tratados e convenções internacionais, que estarão sujeitos a referendo do Congresso Nacional. Rui Stoco121 ensina que, com o advento da condição de submeter o acordo internacional celebrado pelo Presidente, a aprovação do seu texto pelo Congresso Nacional, que emitirá, caso seja aprovado, Decreto Legislativo, que por sua vez será novamente remetido ao Presidente para promulgação por meio de Decreto Presidencial, o Brasil adotou a corrente dualista extremada. Explica ainda122, que a corrente dualista teve como precursor Triepel em 1899, contida na obra de Volkerrecht und Landesrecht, que doutrinava a existência de duas ordens jurídicas, sendo uma interna e outra externa e para que esta última seja inserida na primeira, exige-se um processo de recepção, onde tornará a norma externa em interna. Dessa forma, afasta-se uma possibilidade de conflito entre uma lei infraconstitucional e um tratado ou convenção, visto que as duas estarão no mesmo patamar. Em havendo conflitos, estes serão solucionados adotando as regras pertinentes a solução de conflitos de normas de mesmo grau. Portanto, constata-se que para um tratado ou convenção internacional ser a legislação nacional ser aplicado é necessário respeitar todo um procedimento. No

entanto,

dentre

os

tratados

e

as

convenções

internacionais hoje aplicadas no contrato de transporte marítimo internacional, se destaca a Convenção Internacional para Unificação de Certas regras em Matéria de conhecimento, realizada em Bruxelas no dia 25 de agosto de 1924. Contudo, o Brasil somente ratificou a citada convenção, porém não houve a promulgação da mesma para que tivesse validade no ordenamento jurídico prático123.

121

STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. p. 422. STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. p. 422. 123 CASTRO JR. Osvaldo Agripino de. Aplicação do código de defesa do consumidor ao contrato de transporte marítimo. Universidade do Vale do Itajaí. Produção Científica CEJURPS – 2006. p. 138. 122

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Contudo, é questionável a sua aplicação, tendo em vista que contrataria disposição legais, bem como princípios que regem o direito brasileiro. Por conseguinte, a referida convenção é comumente aplicada aos Contratos de Transporte Marítimo Internacionais, em que se necessita de verificação da ocorrência ou não a responsabilidade do Transportador, como será demonstrado no capítulo seguinte.

CAPÍTULO 3

OS CONTRATOS DE TRANSPORTE MARÍTIMO INTERNACIONAL DE COISAS E A RESPONSABILIDADE CIVIL DO TRANSPORTADOR 3.1 TRANSPORTE MARÍTIMO INTERNACIONAL DE COISAS E OBRIGAÇÕES DO TRANSPORTADOR De acordo com Carla Adriana Comitre Gibertoni124 o Transporte Marítimo Internacional de Coisas se dá pelo contrato de fretamento, ou de transporte marítimo, em que figuram como partes o fretador (armador) e o afretador (o proprietário da mercadoria), sendo que o primeiro, mediante acordo escrito, se compromete a transportar mercadorias por vias aquáticas, recebendo uma quantia em dinheiro que é chamada de frete. Para Leandro Raphael125 “é um acordo escrito mediante o qual o armador se compromete a transportar mercadorias por água, numa expedição marítima, recebendo em troca uma quantia em dinheiro denominada frete.” Ressalta ainda, Flávia de Vasoncellos Lanari126, que pode vir a integrar o contrato de transporte o destinatário da mercadoria, desde que este, no momento da contratação assumir a responsabilidade de pagamento do transporte. Para compor o valor do transporte ou frete, como é denominado, segundo Carla Adriana Comitre Gibertoni127, existem fatores referenciais para a fixação do frete, que englobam despesas arcadas pelo

124

GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. 2ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 174. 125 RAPHAEL, Leandro. Direito marítimo. São Paulo: Aduaneiras, 2003. p. 51. 126 LANARI, Flávia de Vasconcellos. Direito marítimo: contratos e responsabilidade. Belo Horizonte: Del Rey, 1999. p. 87 e 88. 127 GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 175.

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armador para a carga e descarga das mercadorias, além de outros fatores, tais como peso, sendo em toneladas métricas, unidade de volume, em metro cúbico, ou ao valor intrínseco da mercadoria. No entanto, segundo a mesma autora, o valor do frete será fixado como melhor convier ao armador. O Código Comercial Brasileiro traz, em seu art. 566, o conceito de contrato de fretamento na legislação brasileira: O contrato de fretamento de qualquer embarcação, quer seja na sua totalidade ou em parte, para uma ou mais viagens, quer seja à carga, colheita ou prancha, ou que tem lugar quando o capitão recebe carga de quantos se apresentam, deve provar-se por escrito. No primeiro caso o instrumento, que se chama “cartapartida” ou “carta de afretamento”, deve ser assinado pelo fretador e afretador; e por quaisquer outras pessoas que intervenham no contrato, do qual se dará a cada uma das partes um exemplar; no segundo, o instrumento chama-se conhecimento, e basta ser assinado pelo capitão e o carregador. Entende-se por fretador o que dá, e por afretador o que toma a embarcação a frete.

Leandro Raphael128 comenta que as regras dispostas no Código Comercial coadunam com as regras obedecidas pelo Transporte Marítimo Internacional de Mercadorias, bem como na forma do contrato, visto que as formas admitidas são através do Charter Party, ou seja, em português “cartapartida” ou “carta de afretamento” e Bill of Lading, traduzido como conhecimento de embarque. Carla Adriana Comitre Gibertoni129 assim define os contratos citados pela legislação pátria: Se o contrato se refere ao fretamento ou afretamento de todo um navio, o documento se denomina carta partida (“charter party”) contrato ou apólice de fretamento (contract of affreightment); se o fretamento é parcial, para pequenos lotes de mercadorias, o instrumento fica restrito ao conhecimento de embarque (“Bill of lading”) ou um booking note (reserva de praça). 128 129

RAPHAEL, Leandro. Direito marítimo. p. 53. GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 178.

67

No entanto, as referidas espécies de contrato de transporte marítimo, segundo Carla Adriana Comitre Gibertoni130, são praticados de cinco formas, sendo elas: 1. No contrato a casco nu, a posse do navio permanece com o afretador e a administração com o proprietário, entretanto, pode o fretador ficar com a posse e administração do navio, onde receberá a denominação de bareboat charter party, sendo que a responsabilidade da emissão da carta partida ou do boletim de conhecimento de embarque será pelo mesmo; 2. Por tempo ou prazo (timer charter party), nessa forma o afretador toma o navio em aluguel, devidamente equipado pelo proprietário e se responsabiliza pela emissão do conhecimento, porém a posse do navio permanece com o proprietário, ou seja, o proprietário controla todo o navio, mas o coloca a disposição do afretador por um prazo determinado; 3. Por viagem (rate, trip, Voyage charter), é o contrato onde toma o navio inteiro, chamado de viagem redonda (“single Voyage”) ou por viagens consecutivas (“consecutives voyages”), entre dois ou mais portos enumerados, sendo calculado por tonelada o preço do frete. O fretador se responsabiliza pela emissão do conhecimento de embarque, visto que detém a posse do navio. No entanto, nessa modalidade o proprietário cede o navio devidamente equipado e se fica responsável por todas as despesas da viagem; 4. Fretamento parcial, essa forma de contrato é equiparado ao contrato de fretamento por viagem. No entanto, nessa modalidade se difere, visto que o espaço do navio será dividido em várias pequenas partes, para acomodação de várias embarcações. O conhecimento de embarque será emitido pelo fretador. Esse tipo de contrato é o mais comum devido ao grande porte dos navios existentes;

130

GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p.

68

5. Fretamento total, é somente utilizado quando o navio será utilizado por um afretador. No entanto, em não constando cláusula que inibidora, pode o afretador subfretar a terceiros para transportar mercadorias destes. Esse tipo de contrato é mais comum para transporte de carvão e petróleo, pois ocupa todo o espaço destinado a carga. No art. 570 do Código Comercial encontra-se prevista essa modalidade de contrato. Identificadas algumas espécies de contrato de transporte marítimo de carga, percebe-se de maneira geral que se trata basicamente de um contrato de aluguel, entabulado pelo afretador e o fretador, onde ora um figura como responsável pela expedição do conhecimento de embarque ou carta partida, ora é o outro, dependendo o tipo do contrato. No entanto, a presente monografia tem por escopo apurar a responsabilidade do Transportador Marítimo nos Contratos de Transporte Marítimo Internacional de Carga, ou seja, o fretador marítimo que como tal, possui obrigações legais para cumprir na relação contratual, que ora se passa a identificar. Theophilo de Azevedo Santos131 assevera, que a obrigação do transportador marítimo é dividida em antes de iniciada a viagem, durante e finda a mesma: a) Antes da viagem o transportador deverá por a disposição do afretador para receber a carga no dia e hora marcada, caso não tenha hora certa para iniciar viagem o capitão do navio será responsável para decidir o momento em que o navio estiver preparado para receber a carga. Possui a obrigação antes de iniciada a viagem, também de receber e arrumar a carga; expedir conhecimento de embarque de acordo com a Lei e iniciar o transporte. b) Durante a viagem a obrigação do transportador é de transportar as mercadorias, conservando-as devidamente; ter o navio total condições de continuar a viagem, providenciando os consertos quando 131

SANTOS, Theophilo de Azevedo. Direito da navegação (marítima e aérea): doutrina, jurisprudência, legislação. 2 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1968. p. 223 – 226.

69

necessários. Contudo, se não existir condições de operar o conserto durante a viagem, o transportador deverá providenciar outro navio para continuar o transporte; seguir a rota estabelecida, dela não desviando. c) Finda a viagem o transportador deverá aportar o navio no local determinado pelas normas da administração e entregar ao destinatário ou consignatário a mercadoria na mesma condição que a recebeu. Geraldo Bezerra de Moura132 relaciona as seguintes obrigações do transportador: 1) Receber, transportar e entregar as mercadorias no tempo e lugar convencionados; 2) Expedir o conhecimento de frete (cf. Código Comercial, art. 100; Decreto n° 19.473, de 10 de dezembro de 1930 q ue regula os conhecimentos de transporte de mercadorias por terra, água ou ar e dá outras providências); 3) Seguir o itinerário ajustado para o transporte da mercadoria (cf. art. 110 do Código Comercial); 4) Aceitar a variação da consignação (cf. art. 113 do Código Comercial e Decreto n° 19.473/1930, art. 4° e 7°).

Por fim, do art. 590 em diante do Código Comercial Brasileiro, traz os direitos e obrigações o Transportador nos contratos de Transporte Marítimo Internacional de Carga, sendo que as quais já foram abordadas pelos encíclicos doutrinadores anteriormente expostos. Não obstante observadas as obrigações do transportador, este poderá ser responsável por avarias que vierem a afetar a carga, caso em que deverá ressarcir de acordo com a forma ajustada. 3.2 AVARIAS NO TRANSPORTE MARÍTIMO De acordo com Carla Adriana Comitre Gibertoni133, a avaria em sentido jurídico possui significado amplo, visto que abarca não só os danos

132

MOURA, Geraldo Bezerra de. Direito da navegação em comércio exterior. São Paulo: Aduaneiras, 1991. p. 201/202.

70

que podem ocorrer aos navios ou com as cargas nos acidentes marítimos, mas engloba todas as despesas extraordinárias necessária para suportar o dano, bem como todas as despesas ocorridas durante a viagem, desde o embarque até seu desembarque. Geraldo Bezerra Moura134esclarece que: (...) para que sejam consideradas avarias neste sentido técnico é necessário que esses danos acontecidos àqueles ou a esta sejam extraordinários, e, por conseguinte entrem na categoria de fatos imprevistos. Se fossem apenas fatos normais próprios da rotina de navegação, tudo resvalaria em previsões e cálculos dos interessados. E, neste ponto, desapareceu a figura da liquidação, repartição e contribuição, elemento indispensável da avaria grossa.

O Código Comercial Brasileiro no seu art. 761 conceitua avaria: Todas as despesas extraordinárias feitas a bem do navio ou da carga, conjunta ou separadamente, ou todos os danos acontecidos àquelas ou a esta, desde o embarque ate a sua volta e desembarque, são reputadas avarias.

Segundo Leandro Raphael135, avaria tem a seguinte classificação: De dano (avaries-dommages), quando compreendem prejuízos materiais. Avarias-despesas (avaries-domages), quando se trata de despesas realizadas em carater extraordinário, isto é, que não foram cogitadas, causadas por força maior. As avarias, não havendo convenção particular ajustadas entre as partes, exarada na carta partida ou no conhecimento, qualificamse e regulam-se pelas disposições legais pertinentes; no caso brasileiro, pelas disposições do Código Comercial (art. 762).

133

GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 206. MOURA, Geraldo Bezerra de. Direito da navegação em comércio exterior. p. 233. 135 RAPHAEL, Leandro. Direito marítimo. p. 67 134

71

No entanto, não obstante a classificação das avarias em avaria dano e avaria despesas, que estabelecem a distinção entre as despesas com a reparação dos danos ocorridos no navio ou a carga, ou ainda em ambos e as despesas decorrentes de gastos inesperados, ou necessários para que o navio conclua a expedição marítima com sucesso, importante ressaltar que a classificação mais importante se divide em avaria grossa e avaria particular. 3.2.1 Avaria Grossa As Avarias Grossas encontram-se disciplinadas no art. 764 do Código Comercial, onde relaciona 21 itens classificados como Avarias Grossas e, ao final, expõe: E, em geral, os danos causados deliberadamente em caso de perigo ou desastre imprevisto e sofrido como conseqüência imediata destes eventos, bem como as despesas feitas em iguais circunstancias, depois de deliberações motivadas (art. 509), em bem e salvamento comum do navio e mercadorias, desde a sua carga e partida até o seu retorno e descarga.

Conforme, Carla Adriana Comitre Gibertoni136, a Avaria Grossa ou Comum trata-se de decisões humanas, em que visam proteger interesses maiores, a fim de salvaguardar o bem comum, com o intuito de evitar maiores danos em detrimento da comunidade de interesses, sendo que, em caso de indenização ou reparo, todos os interessados na expedição marítima deverão contribuir, visto que o seu efeito principal é criar reciprocidade de direitos e obrigações. Exemplifica a mesma autora, que o alijamento137 é o tipo de avaria mais comum e que se classifica como avaria grossa ou comum, visto que visa proteger os demais interesses a bordo do navio. De acordo com Carla Adriana Comitre Gibertoni138, as avarias grossas são regidas pelas regras de York-Antuérpia, que são regras 136

GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 212 e 213. Alijameto é o lançamento ao mar de objetos carregados no navio para aliviá-lo. Alijamento é o transbordo das mercadorias para outras embarcações. 138 GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 213. 137

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indicam o que é, ou não, avaria grossa. Definem os fundamentos da avaria, a sua natureza e estabelecem certas circunstâncias como a culpa e despesas em substituição. Essas regras são 7 atualmente, em ordem alfabética, sendo da letra A até a G. Segundo Carla Adriana Comitre Gibertoni139, as Regras de York-Antuérpia fornecem, na Regra A, a seguinte definição de avaria comum: Um ato se caracteriza como de avaria grossa quando, e somente quando, implicar em um sacrifício ou despesa extraordinária, internacional e razoavelmente feito para a segurança comum e no sentido de preservar de um perigo os bens envolvidos na mesma expedição marítima.

Leandro Raphael140 ressalta que as seguintes características essenciais da avaria grossa: - deliberação prévia ou ato voluntário a respeito do sacrifício; - exclusão de culpa do capitão ou do carregador, ou seja, o sinistro, ou perigo de sinistro, não se apresentou por culpa de ninguém; - comunhão de benefícios, ou seja, o objetivo é benefício do navio e da carga ao mesmo tempo, e os danos ou despesas tenham sido efetuados em benefício comum, isto é, do navio e da carga.

No entanto, alguns autores entendem que para ser considerada avaria grossa, o resultado deve ser útil, ou seja, a mesma deve resultar do salvamento do restante da carga e do navio. Contudo, a lei brasileira, bem como as Regras de York-Antuérpia não fazem essas exigências, sendo as perdas, danos ou despesas admitidas como tal. J.

Haroldo

dos

Anjos

e

Carlos

Rubens

Gomes141

exemplificam: Um navio carrega carga no convés e sob mau tempo; o Capitão, verificando que a estabilidade do navio está comprometida, e que 139

GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 214. RAPHAEL, Leandro. Direito marítimo. p. 68. 141 ANJOS, J. Haroldo dos. GOMES, Carlos Rubens. Curso de direito marítimo. Rio de Janeiro: Renovar, 1992. p. 79. 140

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pode haver naufrágio, manda largar a peação para que a carga caia no mar, assim, “aliviando” o navio – má ação deliberada do comando, em beneficio do navio e da carga, e cujos prejuízos devem ser rateados por todos, sendo, portanto, uma avaria grossa.

Diante do que foi visto, pode-se entender que as avarias grossas englobam: a) o fato extraordinário, que ocasione as despesas, ou danos ao navio, ou a carga; b) a ação emanada da vontade humana, feito em benefício do navio ou da carga ao mesmo tempo, devendo beneficiar-se a ambos conjuntamente; e c) tem como termo inicial da expedição marítima o porto de partida e final o porto de desembarque. Por fim, Carla Adriana Comitre Gibertoni142, ressalta que a avaria grossa, tem como efeito principal criar um direito e uma obrigação simultânea, ou seja, diante dos fatos ocorridos, todos os interessados na expedição marítima serão indenizados, em contrapartida todos estarão obrigados a contribuírem para a indenização. 3.2.2 Avaria Particular A avaria particular pode ser chamada de avaria simples, que, segundo Carla Adriana Comitre Gibertoni143, são oriundas de caso fortuito ou força maior, nessa espécie a vontade do homem não intervém, porém responde nos casos de imprudência, imperícia ou negligência, de dolo do comandante, equipagem ou empregados do armador, podendo ser até terceiros. Avaria simples ou particular para Leandro Raphael144: É a que a vontade humana não intervém para resguardar interesses relativos ao navio ou à carga; as avarias particulares são enumeradas no art. 766 do Código Comercial Brasileiro, dispondo, que são em geral, as despesas feitas e o dano sofrido só pelo navio, ou só pela carga, durante o tempo dos riscos. A avaria particular pode ocorrer durante a viagem ou mesmo

142

GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 213. GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 211. 144 RAPHAEL, Leandro. Direito marítimo. p. 68 e 69. 143

74

enquanto o navio estiver parado, durante o embarque e desembarque, podendo derivar: - de fortuna do mar: não só caso fortuito ou força maior, incêndio ou albaroamento, mas todo e qualquer evento ocorrido no mar; - de vício próprio: quanto ao navio (má qualidade dos materiais de construção, má manutenção, etc.) e quando à carga (facilidade de decomposição de certas mercadorias, mau acondicionamento, etc.) - faltas do capitão: falta de vigilância, pois é depositário da carga.

Portanto, de acordo com a doutrina acima citada, as avarias particulares são danos ocorridos ao navio, ou a carga individualmente, em que não há a vontade de salvaguardar o bem comum, sendo decorrentes dos acidentes da navegação. O art. 766 do Código Comercial enumera os tipos de avarias particulares, onde relaciona vários tipos de acidentes da navegação e ao final ressalta que, ”as despesas feitas e o dano sofrido pelo navio, ou só pela carga, durante o tempo dos riscos”. Carla Adriana Comitre Gibertoni145 menciona: “(...) a questão da avaria da mercadoria provocada por borrasca (art. 766, 1, CCom) ou tempestade,

que

isentam

de

responsabilidade

do

armador

fretador

e

transportador, onerando tão somente o segurador”. Salienta Flávia de Vasoncellos Lanari146, que no caso de avaria simples ou particular não estão sujeitas a responsabilidade do transportador, salvo de previamente acordado no contrato de seguro ajustado. 3.3. EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE CIVIL DO TRANSPORTADOR MARÍTIMO DE COISAS POR AVARIAS ANJOS e GOMES147 entendem que para que haja uma imputação de responsabilidade civil, há a necessidade da existência da relação 145

GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 211. LANARI, Flávia de Vasconcellos. Direito marítimo: contratos e responsabilidade. Horizonte: Del Rey, 1999. p. 111. 146

Belo

75

de causalidade, entre o agente causador do dano, a vítima e o fato, em que dependendo da circunstância ter-se-á a presença das excludentes de responsabilidade civil. A doutrina é unânime em considerar como excludente de responsabilidade do transportador marítimo: a) ausência de nexo causal; b) culpa exclusiva da vítima; c) fato exclusivo de terceiro; d) Caso fortuito ou força maior; e, e) vício próprio. LANARI148 entende que: (...) ao transportador, exonerar-se de sua responsabilidade provando que a inexecução das obrigações assumidas decorreu de fatos a ele não imputáveis, tais como, na hipótese de ter havido falta do afretador, o vício próprio da mercadoria, embalagem inadequada, ou se tiver ocorrido caso fortuito ou força maior.

Adiante, serão tratadas cada uma dessas excludentes: a) Ausência de nexo causal. GIBERTONI149 assevera que, “inexistindo a relação de causa e efeito entre a ação ou omissão do agente e o fato ocorrido, não existe a responsabilidade”. No mesmo sentido ANJOS e GOMES150 ensinam que, “Exclui a responsabilidade por inexistência da relação de causa e efeito entre a ação ou omissão e o fato ocorrido”. b) Culpa exclusiva da vítima. De acordo com ANJOS e GOMES151, ocorre culpa exclusiva da vítima quando ao agente pressupõe o dolo ou culpa pela ação ou omissão, liberando o autor do dano de qualquer responsabilidade.

147

ANJOS, J. Haroldo dos. GOMES, Carlos Rubens. Curso de direito marítimo. p. 229. LANARI, Flávia de Vasconcellos. Direito marítimo: contratos e responsabilidade. p. 112. 149 GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 356. 150 ANJOS, J. Haroldo dos. GOMES, Carlos Rubens. Curso de direito marítimo. p. 230. 151 ANJOS, J. Haroldo dos. GOMES, Carlos Rubens. Curso de direito marítimo. p. 230. 148

76

Acrescenta

GIBERTONI152

que,

“No

caso

de

culpa

concorrente, a indenização reduz-se proporcionalmente, ou pela metade”. c) Fato exclusivo de terceiro. GIBERTONI153 conceitua que, o fato exclusivo de terceiro somente ocorre quando um fato extraordinário envolve uma terceira pessoa, não integrante da relação jurídica entre as partes contendoras. No entanto, ressalta ANJOS E GOMES154 que: Os prepostos ou empregados, filhos, curatelados, apesar de serem terceiros na relação jurídica, não são considerados, nessa condição, para efeito de imputação da responsabilidade aos seus patrões ou comitentes, pais, curadores e tutores, pois nesse caso, incide a responsabilidade indireta desses em relação ao dano causado por aqueles, face ao vínculo jurídico obrigacional.

Exemplifica

GIBERTONI155,

como

excludente

de

responsabilidade ocasionada por fato de terceiro as greves e os lockouts. Porém, tais fatos não poderão ocorrer por culpa do transportados, pois se for constatado sua culpa o transportador responderá pelos danos causados na carga devido ao atraso na entrega. d) Caso fortuito ou força maior. GIBERTONI156 entende que caso fortuito os acontecimentos possíveis, mas imprevisível, ou de total desconhecimento do homem. Já a força maior enquadra-se nos acontecimentos previsíveis, porém nada se pode fazer para evitar seu acontecimento mesmo que queira. ANJOS e GOMES157 entendem que:

152

GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 358. GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 358. 154 ANJOS, J. Haroldo dos. GOMES, Carlos Rubens. Curso de direito marítimo. p. 230. 155 GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 358. 156 GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 359. 157 ANJOS, J. Haroldo dos. GOMES, Carlos Rubens. Curso de direito marítimo. p. 230 e 231. 153

77

Juridicamente são expressões sinônimas; mas enquanto o caso fortuito dir-se-á do acontecimento possível, porém imprevisível ou estranho à ação humana por força maior deve-se entender o acontecimento previsível, mas inevitável pela simples manifestação da vontade ou da ação humana; por força maior deve-se entender o acontecimento previsível, mas inevitável pela simples manifestação da vontade ou da ação humana.

No entanto, ressalta LANARI158, que somente deverá ser caracterizada o caso fortuito e a força maior quando o fato impeditivo for de caráter absoluto, ou seja, toda simples dificuldade, facilmente superável, ou que onere mais o transporte, desde que não resulte em prejuízos extraordinários, não caracteriza caso fortuito e força maior, visto que em todo negócio há a hipótese e ocorrência de áleas e ricos próprios do empreendimento. No mesmo sentido, GIBERTONI159 entende que: “(...) o evento imprevisível, mas evitável, ou o imprevisível e inevitável, mas superável quanto aos incidentes sobre a execução contratual, não constitui caso fortuito ou força maior”. Portanto, diante do exposto, se constata que para que o transportador possa se beneficiar dessa excludente, deverá demonstrar que o dano ocorreu única e exclusivamente por causa dos eventos imprevisíveis, ou previsíveis, porém inevitáveis, eis que se restar caracterizado alguma falta, logo incorrerá em culpa e responderá pelo dano. Porém, será necessário a analise de caso in concreto. e) Vício próprio. ANJOS e GOMES160 definem que o vício próprio decorre da natureza da própria carga que está sendo transportada, podendo ser imprevisível ou previsível, sem que o dano sofrido tenha sido ocasionado por culpa do transportador.

158

LANARI, Flávia de Vasconcellos. Direito marítimo: contratos e responsabilidade. p. 116. GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 360. 160 ANJOS, J. Haroldo dos. GOMES, Carlos Rubens. Curso de direito marítimo. p. 232. 159

78

Da mesma forma GIBERTONI161 define vício próprio como “todo e qualquer evento danoso, seja previsível ou imprevisível, resultante da própria natureza da carga transportada, sem que ocorra direta ou indiretamente, por culpa do transportador”. ANJOS e GOMES162 exemplificam e diferenciam vício próprio de vício oculto na coisa, sendo que o primeiro ocorre quando uma carga de natureza perecível venha a perecer antes da entrega e no segundo é classificado como vício redibitório, que pode tornar a mercadoria imprópria ao uso a que se destinava, ou lhe reduz o valor, face ao contrato comutativo. Ressaltam ainda os mesmos autores, que há a possibilidade de ocorrência de perdas ou avarias nas cargas, devido a própria fragilidade das mesmas, ou da forma como foram embaladas para o transporte, como por exemplo embalagens em caixa de papelão ou outro material frágil, ao invés de caixa de madeira, para o armazenamento de latas ou tambores de óleo, etc. Portanto, segundo GIBERTONI163, “o vício próprio da carga, em si, é o defeito latente, que se manifesta durante a viagem, e que não era ou não podia ser conhecido antes do início da viagem”. Completa ANJOS e GOMES164 que: Com efeito, desde que previamente ressalvado pelo armador ou seus prepostos, não cabe qualquer indenização, em casos de vício próprio, correndo por conta dos donos das mercadorias, durante o transporte, salvo na existência de cláusula expressa. Do contrário, o armador toma sobre si os riscos e os encargos das mercadorias suscetíveis de vício próprio, durante o transporte, se não ressalvar no conhecimento ou em outro documento hábil – a carta partida ou o protesto -, a menos que essa possibilidade seja, de forma tal, que em face da natureza da carga seria impossível a identificação ou previsão do risco, por ocasião do embarque.

161

GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 361. ANJOS, J. Haroldo dos. GOMES, Carlos Rubens. Curso de direito marítimo. p. 232. 163 GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 361. 164 ANJOS, J. Haroldo dos. GOMES, Carlos Rubens. Curso de direito marítimo. p. 232. 162

79

Contudo, de acordo com ANJOS e GOMES165, há entendimentos jurisprudenciais que não aceitam a ressalva como excludente de responsabilidade, somente será aceito se houver indícios que o transportador empregou todos os cuidados com a carga, com o objetivo de evitar a incidência do vício próprio. Porém, discordam de tal entendimento, pois o transportador estaria assumindo o risco da negligência ou imprudência do interessado, descaracterizando o a finalidade do contrato, sobrepondo-se fatores meramente econômicos,

alheios

ao

interesse

recíproco

e

à

segurança

da

carga

transacionada. Porém, destaca GIBERTONI166 que: Nas hipóteses de vício próprio, caso fortuito ou força maior, cabe ao armador o ônus da prova. Ou seja, a prova de que os danos provierem desses fatos cabe ao transportador. Se este não se cercar de todas as cautelas devidas, ressalvando, por exemplo, a possibilidade de vício próprio, fica impraticável a produção da prova após a ocorrência do fato ou evento danoso por vício próprio. A ressalva no conhecimento, carta partida ou competente protesto marítimo faz presunção juris tantum de que a carga que vier a sofrer danos ou avarias teve previsão antecipada dos efeitos do vício, implicando, dessa forma, em limitação da responsabilidade do armador ou transportador, eis que a parte interessada – o dono da carga –, instada sobre a possibilidade do evento, não tomou nenhuma providência, razão pela qual não se pode permitir que se beneficie da sua própria negligência ou máfé.

Portanto, diante de tais entendimentos, constata-se que vício próprio é o defeito oriundo da própria carga, que venha resultar na perda ou avariar a mesma durante a viagem, sem que fosse possível o seu conhecimento antes do inicio da viagem, entretanto, para que seja possível a dessa excludente de responsabilidade o armador deverá fazer constar ressalva na carta-partida, conhecimento de embarque ou protesto, ou mediante cláusula expressa no contrato.

165 166

ANJOS, J. Haroldo dos. GOMES, Carlos Rubens. Curso de direito marítimo. p. 232. GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 364.

80

3.4 OS TERMOS INICIAL E FINAL DA RESPONSABILIDADE DO TRANSPORTADOR De

acordo

com

LANARI167,

a

responsabilidade

do

transportador está diretamente relacionada com a obrigação de receber a carga a bordo e organizá-las, incluindo a supervisão da estivação da carga. Segundo

LANARI168

a

responsabilidade

do

armador

(transportador) no momento em que a carga deixa o piso do cais ou do caminhão que a transportou, podendo ser içada por guindaste de bordo ou do porto. Porém o transportador terá direito de regresso contra a entidade estivadora ou ao porto. LANARI169 classifica que: Podem surgir duas possibilidades no momento da estivação: a) o carregamento é feito com equipamento pertencente ao armador e, neste caso, obviamente, a responsabilidade, será deste último; b) o carregamento é feito com equipamento pertencente ao porto e, neste caso dever-se-ão distinguir duas hipóteses: 1. se a avaria aconteceu desde a posição ao lado do navio até o convés, o armador pode responsabilizar o porto e requerer indenização; 2. se a avaria aconteceu passada a altura do convés, dentro do porão, a responsabilidade será do armador, mesmo no caso de culpa do próprio guindasteiro.

Entende a mesma autora que no momento da descarga das mercadorias o transportador tem a obrigação de agir com uma razoável diligência no cuidado das mercadorias, porém terá o mesmo direito de regresso quando for no momento do carregamento. Porém, após o descarregamento das mercadorias, o transportador manterá depositadas as mercadorias por um tempo, para que a fiscalização alfandegária proceda às devidas averiguações. No entanto, o transportador irá entregar a mercadoria mediante recibo, com as devidas ressalvas referentes às condições das mercadorias, a um armazém, que pode ser de sua propriedade ou do porto e a responsabilidade transfere-se para esses.

167

LANARI, Flávia de Vasconcellos. Direito marítimo: contratos e responsabilidade. p. 124. LANARI, Flávia de Vasconcellos. Direito marítimo: contratos e responsabilidade. p. 124. 169 LANARI, Flávia de Vasconcellos. Direito marítimo: contratos e responsabilidade. p. 124. 168

81

Ressalta LANARI170, que: Em muitos conhecimentos, tem-se incluído a cláusula After Tackle, ou seja, após guincho ou talha, seguindo a qual a responsabilidade do armador cessa após o descarregamento das mercadorias. No entanto, esta cláusula não é unanimemente interpretada em todos os países, dado o direcionamento da jurisprudência norte-americana, segundo a qual, mesmo existindo essa cláusula, a responsabilidade só cessa após a entrega das mercadorias ao consignatário.

Por fim, entende LANARI171 que os acordos realizados entre as partes a respeito da armazenagem, são perfeitamente válidos. 3.5. CLÁUSULAS EXONERADORAS AJUSTADAS ENTRE O TRANSPORTADOR E O CARREGADOR A

doutrina

denomina

as

cláusulas

exoneradoras

de

responsabilidade ajustadas entre o transportador e o carregador, como cláusula de não responsabilidade ou cláusula de não indenizar. 3.5.1. Conceito Cláusulas exoneradoras GIBERTONI172 entende que: A cláusula de não indenizar ou a cláusula de irresponsabilidade é a convenção das partes em isentar o devedor reparar o dano. Trata-se de uma cláusula contratual acessória, destinada a afastar as normais conseqüências da inexecução contratual.

ANJOS e GOMES173 afirmam que, a cláusula de não indenizar – “É inserida nos contratos de transportes e afretamentos, com finalidade específica de excluir a responsabilidade do transportador ou afretador”.

170

LANARI, Flávia de Vasconcellos. Direito marítimo: contratos e responsabilidade. p. 126. LANARI, Flávia de Vasconcellos. Direito marítimo: contratos e responsabilidade. p. 126. 172 GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 365 e 366. 173 ANJOS, J. Haroldo dos. GOMES, Carlos Rubens. Curso de direito marítimo. p. 237. 171

82

LANARI174 explica que o transportador, através da inserção das cláusulas de exoneração, estará isento de indenizar a outra parte, independentemente do adimplemento ou não de suas obrigações contratuais. 3.5.2. Vantagens da Cláusulas Exoneradoras De acordo com LANARI175 a inserção das cláusulas exoneradoras de responsabilidade gera um abatimento considerável no frete, visto que o risco do transporte diminui consideravelmente. Conforme GIBERTONI176, as cláusulas de não indenizar tem como fundamento o princípio da autonomia da vontade e na liberdade de contratar. No entanto, segundo LANARI177 as cláusulas exoneradoras deverão constar no conhecimento ou na carta partida de maneira expressa legível e devidamente assinada assinado por seus carregadores, para que surta seus efeitos legais. 3.5.3. Desvantagens das Cláusulas exoneradoras GIBERTONI178 afirma que, a convenção de Bruxelas, de 1924, que dispõe sobre a responsabilidade do transportador, no que se referir às mercadorias e ao estado de navegabilidade do navio, prevê a possibilidade da inclusão das cláusulas de não indenizar, ressalvando que a manifestação não seja contraria a ordem pública. Porém, segundo a mesma autora, a referida Convenção Internacional

para

Unificação

de

Certas

Regras

Concernentes

aos

Conhecimentos Marítimos, de 25/08/1924, não foi ratificada pelo Brasil e não poderá ser aplicada.

174

LANARI, Flávia de Vasconcellos. Direito marítimo: contratos e responsabilidade. p. 127. LANARI, Flávia de Vasconcellos. Direito marítimo: contratos e responsabilidade. p. 127. 176 GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 366. 177 LANARI, Flávia de Vasconcellos. Direito marítimo: contratos e responsabilidade. p. 127. 178 GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 370. 175

83

A Súmula 161 do STF dispõe que: “Em contrato de transporte, é inoperante a cláusula de não indenizar”. Ressalta Eduardo de Avelar Lamy179 que: Aos olhos da ordem jurídica brasileira, portanto, as bases legais em que se fundam os contratos internacionais de transporte marítimo, comprovados pelos conhecimentos de transporte, as chamadas Bill of Ladings, não apenas desrespeitam a Lei de Introdução ao Código Civil, mas também revelam-se verdadeiros contratos de adesão, nos termos do Código de Proteção e Defesa do Consumidor (CDC, art. 54), na medida em que impossibilitam as

discussão

de cláusulas

contratuais

pelos

contraentes,

retirando-lhes a autonomia da vontade.

Portanto, diante de tais entendimentos constata-se que, a legislação brasileira não aceita o conteúdo contido nas cláusulas de não indenizar inserida na carta-partida ou no conhecimento de embarque. 3.6. LEGISLAÇÃO ESPECIAL APLICÁVEL AO CONTRATO DE TRANSPORTE MARÍTIMO De acordo com o anteriormente exposto, se percebe que o Brasil não ratificou o tratado internacional que dispõe sobre as regras de responsabilidade do transportador marítimo, portanto, não há aplicabilidade em território nacional. Porém, segundo GIBERTONI180 a Legislação pátria ainda não codificou detalhadamente a maneira como se deve proceder nesses casos, nem vedando ou permitindo a inclusão das cláusulas de não indenizar nos contratos de transporte marítimo internacionais.

179

LAMY, Eduardo de Avelar. Contrato de transporte marítimo internacional: legislação aplicável e competência. In: CASTRO JR, Osvaldo Agripino de. (org.) Temas Atuais de Direito do Comércio Internacional. Vol. II. Florianópolis: OAB/SC, 2005, p. 411. 180 GIBERTONI, Carla Adriana Comitre. Teoria e prática do direito marítimo. p. 371.

84

Contudo, de acordo com o art. 9º da Lei de Introdução ao Código Civil, aplicar-se-á a lei brasileira para as obrigações aqui constituídas. Portanto, aos contratos de transporte marítimo internacional celebrado pelos importadores ou exportadores brasileiros junto aos armadores estrangeiros, os conflitos oriundos destes, poderão ser dirimidos pela legislação brasileira181. Completa Orlando Morais Filho182 que: Ainda, percebe-se que o conforme o art. 88 do CPC183, o foro competente para dirimir questões acerca da responsabilidade civil no transporte marítimo quando o comerciante for nacional ou possuir domicílio no Brasil, e da mesma forma quando no Brasil for o cumprimento da obrigação ou de responsabilidade de evento acontecido no mesmo pode ser o foro brasileiro.

Da mesma forma esclarece Osvaldo Agripino de Castro Junior184: Assim, pode-se inferir que um Conhecimento de Embarque emitido no Brasil estará sempre sujeito à legislação brasileira, já que a nossa doutrina não admite a autonomia da vontade das partes para escolher a lei aplicável a um contrato, de modo que, qualquer cláusula de Conhecimento de Embarque emitido no país que remeta a uma lei estrangeira ou a uma Convenção Internacional não ratificada pelo Brasil não terá validade. Todavia, modernamente a tendência mundial é da adoção de convenções internacionais que expressamente deixam às partes escolher o direito aplicável às obrigações contratuais internacionais.

181

LAMY, Eduardo de Avelar. Contrato de transporte marítimo internacional: legislação aplicável e competência. In: CASTRO JR, Osvaldo Agripino de. (org.) Temas Atuais de Direito do Comércio Internacional. Vol. II. Florianópolis: OAB/SC, 2005, p. 418. 182 MORAIS FILHO, Orlando. Limites e responsabilidade da aplicação do Código de Defesa do Consumidor no contrato de transporte marítimo. Monografia do Curso de Direito CESUSC, 2006. p. 45. 183 Art.88. É competente a autoridade judiciária brasileira quando: I – o réu, qualquer que seja a sua nacionalidade, estiver domiciliado no Brasil; II – no Brasil tiver de ser cumprida a obrigação; III – a ação se originar de fato ocorrido ou de fato praticado no Brasil. Parágrafo Único. Para fim do disposto no nº I, reputa-se domiciliada no Brasil a pessoa jurídica estrangeira que aqui tiver agência, filial ou sucursal. 184 CASTRO JUNIOR, Osvaldo Agripino de. A Aplicação do código de defesa do consumidor ao contrato de transporte marítimo. Mimeo, 2005. p. 10.

85

Diante do exposto, conforme LAMY185, os contratos de transporte marítimo internacionais, tais como o Bill of Ladings, firmados no Brasil são considerados como contratos de adesão, visto que não há discussão das cláusulas previamente e o Código de Proteção e Defesa do Consumidor (CDC) veda expressamente tal prática no seu art. 54 e o Código Civil dispõe, nos seus art. 423 e 424, a nulidade das cláusulas que estipulem renúncia antecipada de direitos. 3.6.1 Código Civil Como anteriormente assinalado, o Código Civil poderá ser aplicado aos contratos de transporte marítimo, principalmente quando estamos diante de Bill of Ladings (B/L) que vem redigido, de maneira que não possibilita ao importador ou exportador brasileiro de discutir qualquer das cláusulas, ocorrendo o desequilíbrio contratual. Nesse sentido LAMY186 entende que: (...) será aplicável o sistema do CC e as cláusulas de tais compromissos também poderão ser consideradas nulas em razão do desequilíbrio contratual havido, pois a maioria delas refere-se à própria natureza do negócio (CC, art. 424), o que também poderá ocorrer em razão das possibilidades trazidas pelo abuso de direito praticado pelos armadores (CC, art. 187).

Carlos Roberto Gonçalves apud LAMY187acrescenta que: Tendo em vista que o contrato de adesão é integralmente elaborado pelo policitante, economicamente mais poderoso, e que o aderente limita-se a aderir às cláusulas preestabelecidas, sem poder de discuti-las, é dever do primeiro redigi-las com clareza, precisão e simplicidade.

185

LAMY, Eduardo de Avelar. Contrato de transporte marítimo internacional: legislação aplicável e competência. In: CASTRO JR, Osvaldo Agripino de. (org.) Temas Atuais de Direito do Comércio Internacional. Vol. II. Florianópolis: OAB/SC, 2005, p. 411. 186 LAMY, Eduardo de Avelar. Contrato de transporte marítimo internacional: legislação aplicável e competência. In: CASTRO JR, Osvaldo Agripino de. (org.) Temas Atuais de Direito do Comércio Internacional. Vol. II. Florianópolis: OAB/SC, 2005, p. 421. 187 LAMY, Eduardo de Avelar. Contrato de transporte marítimo internacional: legislação aplicável e competência. In: CASTRO JR, Osvaldo Agripino de. (org.) Temas Atuais de Direito do Comércio Internacional. p. 421.

86

A Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem se manifestado em considerar como não escrito no contrato quando houver cláusula limitadora da responsabilidade ou cláusula de não indenizar, ou seja, segue o entendimento que tais cláusulas ferem os preceitos da legislação pátria e não contém qualquer validade no ordenamento jurídico brasileiro. Dessa forma já decidiu a Terceira Turma do STJ188: REsp 29121 1992/0028623-2

/

SP

;

RECURSO

ESPECIAL

CIVIL E COMERCIAL - SEGURO - TRANSPORTE MARITIMO INDENIZAÇÃO CLAUSULA LIMITATIVA DA RESPONSABILIDADE DO TRANSPORTADOR – SUMULA 161, DO STF. I- REPUTA-SE NÃO ESCRITA QUALQUER CLAUSULA LIMITATIVA DA OBRIGAÇÃO DE NÃO INDENIZAR, EM CONTRATO DE TRANSPORTE MARITIMO, O VALOR CAPAZ DE TORNAR IRRISORIA A INDENIZAÇÃO RELATIVA AOS DANOS CAUSADOS. II- PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. III- RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

Portanto, diante de tais entendimentos, resta devidamente caracterizada a aplicabilidade do Código Civil nos contratos de transporte marítimo. 3.6.2 Código de Defesa do Consumidor Segundo LAMY189, para que o Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90) incida sobre os contratos de transporte marítimo, será necessário a caracterização do desequilíbrio contratual havido entre as partes, sendo classificado uma consumidora e a outra fornecedora.

188

a

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso 3 Turma 16.12.92. Relator: Ministro Waldemar Zveite. Diário de Justiça. 22 de março de 1993, página 4540. 189 LAMY, Eduardo de Avelar. Contrato de transporte marítimo internacional: legislação aplicável e competência. In: CASTRO JR, Osvaldo Agripino de. (org.) Temas Atuais de Direito do Comércio Internacional. p. 419.

87

O art. 2º do CDC define consumidor, sendo toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. A respeito do conceito de consumidor, Claudia Lima Marques190 entende que: O legislador brasileiro parece ter, em princípio, preferido uma definição mais objetiva e consumidor. O art. 2º do Código afirma expressamente que consumidor é “toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final”. Na definição legal, a única característica restritiva seria a aquisição ou utilização do bem como destinatário final. Certamente esse destinatário final é retirar o bem de mercado (ato objetivo), mas se o sujeito adquire o bem para utiliza-lo em sua profissão, adquire como profissional (elemento subjetivo), com fim de lucro, também deve ser considerado “destinatário final”? A definição do art. 2º do CDC não responde à pergunta, é necessário interpretar a expressão “destinatário final”.

Portanto, percebe-se que há uma problemática a respeito do conceito de destinatário final, onde poderá ser aquele que simplesmente retira do mercado, ou aquele que retira do mercado, mas que sua finalidade não poderá fazer parte da cadeia de produção. O dilema acima exposto fez fundir duas correntes, sendo uma finalista e a outra maximalista. MARQUES191 assevera que: Destinatário final é aquele destinatário fático e econômico do bem ou serviço, seja ele pessoa jurídica ou física. Logo, segundo esta interpretação teleológica não basta ser destinatário fático do produto, retira-lo da cadeira de produção, leva-lo para o escritório ou residência, é necessário ser destinatário final econômico do bem, não adquiri-lo para uso profissional, pois o bem seria novamente um instrumento de produção cujo preço será incluído

190

MARQUES, Cláudia Lima, Contratos no código de defesa do consumidor. o novo regime das relações contratuais. 4 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 253. 191 MARQUES, Cláudia Lima, Contratos no código de defesa do consumidor. o novo regime das relações contratuais. p. 253 e 254.

88

no preço final do profissional que o adquiriu. Neste caso, não haveria a exigida “destinação final” do produto ou o serviço. Esta interpretação restringe a figura do consumidor àquele que adquire (utiliza) um produto para uso próprio de sua família, consumidor seria o não profissional, pois o fim do CDC é tutelar de maneira especial um grupo da sociedade que é mais vulnerável. Consideram que restringindo o campo de aplicação do CDC àqueles que necessitam de proteção para estes, pois a jurisprudência será construída em casos, onde o consumidor era realmente a parte mas fraca da relação de consumo e não sobre casos em que profissionais – consumidores reclamam mais benesses do que o Direito Comercial já lhes concede. Note-se que, de uma posição inicial mais forte, influenciada pela doutrina francesa e belga, como veremos, os finalista evoluíram para uma posição mais branda, se bem que sempre teleológica, aceitando a possibilidade do Judiciário, reconhecendo a Vulnerabilidade de uma pequena empresa ou profissional, que adquiriu, por exemplo, um produto fora de seu campo de especialidade, interpretar o art. 2º de acordo com o fim da norma, isto é, proteção ao mais fraco na relação de consumo, e conceder a aplicação da normas especiais do CDC analogicamente também a estes profissionais.

Diante do acima exposto, para a teoria finalista, entende-se que para que seja considerado uma relação de consumo, o destinatário final não poderá adquirir um produto ou serviço quando a pessoa for incluir o produto ou serviço na sua cadeia produtiva, porém a referida teoria tem aceito que figure como consumidor o proprietário da pequena empresa, podendo ser ela exportadora ou importadora. LAMY192 é adepto da teoria finalista e entende que os importadores e exportadores não são consumidores, visto que suas atividades estão, por natureza, inseridas na atividade econômica, muito embora reconheça o desequilíbrio contratual em favor dos armadores prestadores de serviço de transporte internacional, em virtude do regime jurídico do B/L.

192

LAMY, Eduardo de Avelar. Contrato de transporte marítimo internacional: legislação aplicável e competência. In: CASTRO JR, Osvaldo Agripino de. (org.) Temas Atuais de Direito do Comércio Internacional. p. 419.

89

A corrente maximalista prega que não há necessidade de que o produto ou serviço tenha como destinatário final a pessoa que utilizar sem que obtenha lucro ou integre a sua cadeia produtiva, visto que esse pensamento entende que consumidor é aquela pessoa física ou jurídica que adquire um produto ou serviço, e pelo simples fato de retirar do mercado assume essa condição. Dessa forma, MARQUES193 entende que: Já os maximalistas vêem nas normas do CDC o novo regulamento do mercado de consumo brasileiro, e não normas orientadas para proteger somente o consumidor não-profissional. O CDC seria um Código geral sobre o consumo, um Código para a sociedade de consumo, o qual institui normas e princípios para todos os agentes do mercado, os quais podem assumir os papéis ora de fornecedores, ora de consumidores. A definição do art. 2º deve ser interpretada o mais extensivamente possível, um número cada vez maior de relações de mercado. Consideram que a definição do art. 2º é puramente objetiva, não importando se a pessoa física ou jurídica tem ou não o fim de lucro quando adquire um produto adquire um produto ou utiliza um serviço.

LAMY194

esclarece

que

a

corrente

doutrinária

e

jurisprudencial maximalista, classifica como consumidor o exportador que fica com o ônus do transporte, como ocorre nas vendas CIF (cost. Insurance end Freight) ou quando pelo importador brasileiro, especialmente pela FOB (Free on Board), sendo que na primeira situação o exportador fica responsável pelo pagamento do frete e na segunda o importador. CASTRO JUNIOR195, entende que aos contratos de transporte de mercadorias (goods) aplica-se inicialmente o Código Civil, a fim de se apurar a responsabilidade civil, constante no art. 732. Por outro lado, poderá

193

MARQUES, Cláudia Lima, Contratos no código de defesa do consumidor. o novo regime das relações contratuais. p. 254 e 255. 194 LAMY, Eduardo de Avelar. Contrato de transporte marítimo internacional: legislação aplicável e competência. In: CASTRO JR, Osvaldo Agripino de. (org.) Temas Atuais de Direito do Comércio Internacional. p. 420. 195 CASTRO JUNIOR, Osvaldo Agripino de. Aspectos destacados do contrato de transporte marítimo em face do Código de Defesa do Consumidor e do Código Civil. Mimeo, 2005. p. 40.

90

ser aplicado de maneira subsidiária o CDC, desde que devidamente demonstrada a vulnerabilidade na relação contratual. Completa CASTRO JUNIOR196 que em virtude do princípio da

especialidade,

tratando-se

de

responsabilidade

civil,

aplicar-se-á

as

convenções e tratados constantes no contrato, ressalvado se os países das partes contratantes ratificaram os mesmos, bem como de maneira subsidiária o Código Civil, Código Comercial, e Código de Defesa do Consumidor, desde que não contrarie nenhuma das legislações anteriormente citada. O Superior Tribunal de Justiça197 assim tem decido: Resp 302212 / RJ ; RECURSO ESPECIAL 2001/0010266-2. Julgamento. 07/06/2005 RECURSO ESPECIAL AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. TRANSPORTE MARÍTIMO. PRESCRIÇÃO. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. APLICAÇÃO. I - A seguradora sub-roga-se em todos os direitos do segurado, em relação à restituição do valor integral pago a título de indenização pelo prejuízo sofrido pelo consumidor. II - Em caso de ação de indenização decorrente de dano causado em mercadoria durante transporte marítimo, aplicase a prescrição prevista no artigo 27 do Código de Defesa do Consumidor. Recurso especial não conhecido.

Portanto, diante de tais entendimentos, constata-se que é possível a aplicação do Código de Defesa do Consumidor aos Contratos de Transporte Marítimo Internacionais. 3.6.3 Tratado de transporte multimodal do Mercosul. O Tratado de Transporte Multimodal do Mercosul é um acordo firmado entre o Governo da República Argentina, da República do Paraguai, da República Oriental do Uruguai e da República Federativa do Brasil, que tem por escopo um aproveitamento mais eficaz da infratrutura de transporte dos Estados Partes, contribuindo para a redução dos custos operacionais de 196

CASTRO JUNIOR, Osvaldo Agripino de. A aplicação do código de defesa do consumidor ao contrato de transporte marítimo. Mimeo, 2005. p. 16. 197 a BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso 3 Turma 07.06.05. Relator: Ministro Castro Filho. Diário de Justiça. 27 de junho de 2005, página 362.

91

transporte na região, levando-se em conta os princípios essenciais do Tratado de Assunção. Destaca-se de maior relevância para a presente monografia os capítulos III, IV e V, eis que tratam do Conhecimento de Transporte Multimodal e da responsabilidade do Operador de Transporte Multimodal e responsabilidade do Expedidor. 3.6.3.1 Do Documento ou Conhecimento de Transporte Multimodal. O Documento ou Conhecimento de Transporte Multimodal é emitido pelo Operador de Transporte Multimodal, no momento em que toma a mercadoria em custódia, onde poder valer como título negociável ou não, ficando a critério do Expedidor198. Terá vigência em todos os países integrantes do acordo199. Para que o sejam aplicáveis as disposições do acordo, no instrumento deverá constar no documento a frase “Acordo de Transporte Multimodal – MERCOSUL” e prevalecerá sobre as outras cláusulas constantes no contrato que lhes forem contrárias, salvo quando aumenta a responsabilidade e a obrigação do Operador de Transporte Multimodal. Entretanto, o Operador não inscrito ou que não cumpra o disposto no Acordo não poderá gozar seus benefícios200. O

Operador

poderá

fazer

constar

ressalvas

no

Conhecimento de Transporte quando as condições da carga descrita no documento forem iguais as que estiverem sendo transportadas201.

198

Artigo 3° do Tratado de Transporte Multimodal do M ercosul. Artigo 3° do Tratado de Transporte Multimodal do M ercosul. 200 Artigo 4° do Tratado de Transporte Multimodal do M ercosul. 201 Artigo 5° do Tratado de Transporte Multimodal do M ercosul. 199

92

3.6.3.2 Responsabilidade do Operador de Transporte Multimodal A responsabilidade o Operador de Transporte Multimodal tem início no momento em que toma a carga em seu poder e termina quando for entregue ao destinatário ou consignatário202. O Operador será responsável pelas ações e omissões de seus empregados ou agentes no exercício de suas funções e empregará todos os cuidados

necessários

para

o transporte

da

carga,

sob pena

de ser

responsabilizado pelos danos sofridos na mercadoria, bem como pelos prejuízos resultantes do atraso na entrega, se o expedidor tiver feito uma declaração de interesse pela entrega em um prazo determinado e se a mesma tiver sido aceita pelo Operador de Transporte Multimodal203. O

Operador

de

Transporte

Multimodal

não

será

responsabilizado se provara que perda for por causa de: a) ato ou fato imputável ao expedidor, ou ao destinatário, ou ao consignatário da carga, ou a seus agentes, representantes ou procuradores; b) vício próprio ou oculto da carga; c) força maior ou caso fortuito, devidamente comprovados; d) greves, motins ou "lock-out"; e) Dificuldades impeditivas do transporte e outros atos fora do controle do Operador de Transporte Multimodal devidamente comprovados, não existindo outra forma de cumprir o contrato204. O Operador de Transporte Multimodal e todas as pessoas físicas ou jurídicas que intervenham por disposição do mesmo para a movimentação das cargas serão responsáveis pelo aumento das perdas, danos ou avarias e atrasos na entrega das mercadorias a que derem causa, ainda que não admitam a referida responsabilidade205. No caso de atraso na entrega da mercadoria, quando não foi previamente acordado tempo de entrega, será calculado um tempo razoável em

202

Artigo 6° do Tratado de Transporte Multimodal do M ercosul. Artigo 7° do Tratado de Transporte Multimodal do M ercosul. 204 Artigo 10 do Tratado de Transporte Multimodal do Mercosul. 205 Artigo 9° do Tratado de Transporte Multimodal do M ercosul. 203

93

que se normalmente levaria para realizar o transporte, tomando em consideração as circunstâncias do caso206. Se passados 90 dias corridos depois da data da entrega estabelecida, o consignatário ou qualquer outra pessoa com direito de reclamar as mercadorias, poderá considerá-las perdidas207. O valor da indenização será fixado de acordo com o valor das mercadorias, constante em uma bolsa de mercadorias, ou na sua falta, com observância do preço que tenham no mercado ou, se não se dispuser dessa quotação nem de seu preço, segundo o valor usual de mercadorias de igual natureza e qualidade208. Salvo se a natureza e o valor das mercadorias tenham sido declarados no conhecimento pelo expedidor antes que o Operador de Transporte Multimodal tenha as tomado em sua posse, o mesmo não será responsabilizado por nenhuma perda ou dano sofrido na carga, por valor além do limite de responsabilidade que cada Estado Parte, fixada no presente tratado209. Se houver perda ou dano em um trecho determinado, onde estiver sobre a égide de outra Convenção Internacional ou determinada Lei imperativa, que fixar outro limite de responsabilidade do que o especificado nesse acordo aplicar-se-á o limite da Convenção Internacional ou a Lei imperativa210. Se o Operador de Transporte Multimodal for responsável a indenizar as perdas e danos ocorridos na carga, o valor da indenização não poderá ser superior o valor do frete ou os limites de responsabilidade das mercadorias, salvo se restar devidamente comprovado que o Operador tenha origem em uma ação ou omissão a ele imputada, com dolo, ou culpa grave211.

206

Artigo 11 do Tratado de Transporte Multimodal do Mercosul. Artigo 11 do Tratado de Transporte Multimodal do Mercosul. 208 Artigo 12 do Tratado de Transporte Multimodal do Mercosul. 209 Artigo 13 do Tratado de Transporte Multimodal do Mercosul. 210 Artigo 15 do Tratado de Transporte Multimodal do Mercosul. 211 Artigo 16 do Tratado de Transporte Multimodal do Mercosul. 207

94

Responde solidariamente com o Operador de Transporte Multimodal, o seguimento que restou claramente identificado e comprovado a sua culpa na execução do contrato, sem prejuízo do direito de regresso212. 3.6.3.3 Responsabilidade do Expedidor O expedidor deverá garantir a exatidão das mercadorias no momento em que o Operador de Transporte Multimodal toma-as sob sua custódia, de todos os dados relativos à natureza geral das mercadorias, suas marcas, números, peso, volume e quantidade e, se procedente, o seu caráter perigoso, proporcionado por ele próprio ou por meio de outra pessoa que atue em seu nome, para inclusão no Documento ou conhecimento de Transporte Multimodal213. O expedidor será responsável pelos prejuízos causados pelas inexatidões ou insuficiências dos dados antes mencionados, ainda que tenha transferido o documento ou conhecimento de transporte multimodal214, Porém, o Operador de Transporte Multimodal, mesmo tendo direito ao ressarcimento do Expedidor, tal direito não limitará a responsabilidade, em virtude do contrato de transporte multimodal, com relação a qualquer pessoa distinta215.

212

Artigo 19 do Tratado de Transporte Multimodal do Mercosul. Artigo 20 do Tratado de Transporte Multimodal do Mercosul. 214 Artigo 20 do Tratado de Transporte Multimodal do Mercosul. 215 Artigo 20 do Tratado de Transporte Multimodal do Mercosul. 213

95

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho teve como objetivo destacar a Responsabilidade Civil do Transportador no Contrato de Transporte Marítimo Internacional de Mercadoria, face as avarias ocorridas durante a viagem. Para seu desenvolvimento lógico, o trabalho foi dividido em três capítulos. O Responsabilidade

Civil,

primeiro

tratou

iniciando-se

das pelos

Noções aspectos

Gerais históricos

sobre da

Responsabilidade Civil. Após, abordou-se a respeito do conceito e elementos, sendo que Responsabilidade Civil é o dever de indenizar que uma pessoa possui em virtude da violação de direito de outrem, seja no âmbito patrimonial ou extrapatrimonial, tendo como elementos a ação ou omissão, culpa ou dolo do agente e a relação de causalidade. Em seguida, destacou-se as espécies e formas da Responsabilidade Civil, sendo as espécies contratual e extracontratual e as formas subjetiva e objetiva. Em síntese, a Responsabilidade Civil Contratual está diretamente ligada à violação de um contrato previamente firmado, podendo incorrer o agente causador em culpa ou não, sendo nesse último caso a Responsabilidade

Civil

Objetiva.

Entretanto,

a

Responsabilidade

Civil

Extracontratual está relacionada a prática de ato ilícito e é imprescindível a caracterização da culpa do agente causador do dano, ou seja, ocorrendo somente na forma subjetiva. Por fim, demonstrou-se a possibilidade do agente causador do dano não reparar o dano, ou, ao menos amenizar a quantia a ser indenizada, desde que o agente se encontre em qualquer dessas situações: estado de necessidade; legítima defesa; exercício regular de direito e estrito cumprimento de um dever legal; caso fortuito e força maior; culpa exclusiva da vítima; fato de terceiro.

96

O

segundo

capítulo

foi

destinado

a

apresentar

considerações sobre os Contratos de Transporte e suas Relações Internacionais. Estudou-se o conceito, espécies e formas com seus requisitos e elementos, concluindo-se que o contrato de transporte é um tipo de contrato que gera obrigações para as duas partes, sendo a prestação do serviço pelo transportador e a outra o dever de remunerar da forma ajustada, podendo ser Contrato de Transporte de pessoas ou coisas, sob a forma terrestre, aérea, marítima, fluvial ou lacustre. No transporte de coisas constatou-se uma divergência doutrinária no sentido de caracterizar como parte no contrato, ou seja, há entendimentos que classificam como parte o remetente e o transportador, em contrapartida, alguns autores entendem que o destinatário ou consignatário figura também como parte. O remetente tem o dever de fornecer o endereço exato do local da entrega da mercadoria ao transportador, sob pena de responder por perdas e danos. O Transportador tem o dever de entregar a coisa no local descrito no conhecimento de transporte, emitido pelo mesmo e entregue ao remetente endossado para que possa receber a coisa. Porém, o destinatário deve conferi-la e apresentar reclamações no prazo de 10 dias, salvo quando não perceptível a primeira vista ou dano parcial na coisa, desde que denunciado pelo mesmo prazo, a contar da data da entrega. Finalizou-se o segundo capítulo com as Convenções e Tratados

Internacionais

acerca

dos

Contratos

de

Transporte

Marítimo,

constatando-se que devido ao sistema de recepção dos Tratados Internacionais, previsto na Constituição Federal, nem todos os Tratados Internacionais, que hoje são aplicados foram devidamente recepcionado, gerando nulidades contratuais. No último capítulo tratou-se dos Contratos de Transporte Marítimo Internacional de Coisas e a Responsabilidade Civil do Transportador.

97

Constatou-se que, o Transporte Marítimo Internacional é um acordo escrito pelo qual o armador se compromete a transportar mercadorias por água, numa expedição marítima, recebendo em troca uma quantia em dinheiro denominada frete, encontrando-se previsto no art. 566 do Código Comercial Brasileiro. Pôde-se identificar que os contratos de Transporte Marítimo podem ser de duas formas: carta-partida ou conhecimento de embarque. Cartapartida (Charter Party) ocorre quando o Navio é tomado a frete por inteiro e o conhecimento de embarque (Bill of lading) quando a tomada é parcial. Identificou-se também, que as principais avarias são as avaria grossa e avaria particular. Avaria Grossa verifica-se quando o transportador, com o objetivo de salvaguardar o bem comum, para evitar maiores danos até mesmo a sua própria integridade física, decide sacrificar a carga, ou transferi-la para outro navio, sendo que nesses casos a responsabilidade do transportador é compartilhada entre todos os interessados. Avaria Particular é a oriunda de caso fortuito ou força maior. Não há intervenção de vontade humana, porém o transportador responde no caso de imprudência, imperícia ou negligência, de dolo do comandante, equipagem ou empregados do armador, podendo ser até terceiros. Destacou-se que é possível ao transportador marítimo eximir-se da reparação do dano, quando for constatado alguma causa de excludente de responsabilidade, tais como ausência de nexo causal, culpa exclusiva da vítima, fato exclusivo de terceiro, caso fortuito ou força maior e vício próprio. Verificou-se que o termo inicial da responsabilidade do transportador dá-se no momento em que a carga deixa o piso do cais ou do veículo que a transportou, podendo ser içada por guindaste de bordo ou do porto. Porém o transportador terá direito de regresso contra a entidade estivadora ou ao porto.

98

O termo final ocorre quando o transportador entrega a mercadoria a um armazém, em que o proprietário do armazém emitirá um recibo de recebimento, com as devidas ressalvas se houver, ao transportador. O armazém poderá ser de propriedade do Armador ou do Porto e a responsabilidade transfere-se para esses. Importante foi conceituar e identificar as vantagens e desvantagens das Cláusulas Exoneradoras de Responsabilidade ajustadas entre o transportador e o Carregador, visto que é pratica comum no mercado de trabalho hoje, eis que os bill of lading (conhecimento de embarque) são estruturados sob as regras da Convenção Internacional para Unificação de Certas Regras Concernentes aos Conhecimentos Marítimos de 25/08/1924, realizada em Bruxelas. São também denominada de cláusulas de não indenizar ou de irresponsabilidade, em que isenta o devedor de reparar o dano, possui caráter assessório, visto que se destina a afastar as normais conseqüências da inexecução contratual. A inclusão das referidas cláusulas gera um considerável abatimento no frete, tendo em vista que o risco do transportador diminui na mesma proporção. No entanto, tendo em vista que o Brasil não ratificou a referida convenção de Bruxelas e as regras por ela imposta não são aplicáveis neste país, conforme já sumulado pelo Supremo Tribunal Federal – Súmula 161. Portanto, como as regras da Convenção de Bruxelas não são aplicáveis ao sistema jurídico brasileiro, aplicar-se-á subsidiariamente o Código Civil e o Código de Defesa do Consumidor no que forem compatíveis. A aplicabilidade de tais legislações é possível por força do art. 9° da Lei de Introdução do Código Civil, que p revê a aplicabilidade da lei brasileira para as obrigações aqui constituídas. Portanto, os contratos de transporte marítimo internacional celebrado pelos importadores ou exportadores brasileiros junto aos armadores estrangeiros, poderão ter seus conflitos dirimidos pela legislação brasileira.

99

Quanto a regência pelo Código Civil ou Código de Defesa do Consumidor há divergência na classificação ou não o importador ou exportador brasileiro como consumidor. No entanto, para as duas legislações é evidente o desequilíbrio contratual, visto que os Bill of ladings (conhecimentos de embarque) são contratos prontos, em que não são discutidas as cláusulas, caracterizando contrato de adesão com cláusulas leoninas. Destacou-se,

ao

final

do

terceiro

capítulo,

algumas

considerações a respeito do Tratado de Transporte Multimodal do Mercosul, onde observou-se alguns aspectos a respeito do Documento ou Conhecimento de Transporte Multimodal, Responsabilidade do Operador de Transporte Multimodal, bem como da Responsabilidade do Expedidor. Por fim, retoma-se as duas hipóteses levantadas com a pesquisa: A primeira hipóse restou comprovada, visto que, conforme demonstrado, o transportador somente poderá se eximir da responsabilidade reparatória, caso tenha tomado todas as medidas de segurança para a carga, tenha provado a ausência de nexo causal entre o fato danoso e a conduta do Transportador Marítimo, tenha ocorrido por culpa exclusiva do remetente, por fato exclusivo de terceiro, ou, ainda, por vício próprio da mercadoria. A segunda hipótese restou também confirmada, embora na prática, as cláusulas de não indenizar estejam inseridas nos Bill of lading, não possuem valor jurídico nesse país, visto que o Brasil não ratificou a convenção de Bruxelas de 1924, bem como tais normas ferem princípios de ordem pública, ante a renúncia prévia de direitos, ocasionando o desequilíbrio contratual entre as partes. Dessa maneira, vale registrar que foram confirmadas as duas

hipóteses

levantadas

no

início

da

pesquisa.

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(MERCOSUL/CMC/DEC



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